Revelamos aqui as causas e efeitos da insegurança pública e jurídica no Brasil, propondo uma ampla mobilização na defesa da liberdade, democracia, federalismo, moralidade, probidade, civismo, cidadania e supremacia do interesse público, exigindo uma Constituição enxuta; Leis rigorosas; Segurança jurídica e judiciária; Justiça coativa; Reforma política, Zelo do erário; Execução penal digna; Poderes harmônicos e comprometidos; e Sistema de Justiça Criminal eficiente na preservação da Ordem Pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

sábado, 21 de março de 2015

HÁ GOLPISTAS DOS DOIS LADOS



ZERO HORA 22 de março de 2015 | N° 18109


ENTREVISTA

 

Henrique Capriles é candidato natural à presidência na Venezuela. Leia trechos da entrevista a Zero Hora.


Passados dois anos da eleição de 2013, o senhor acha que perdeu mesmo para Maduro?

Não. Na ocasião, pedi auditoria. Quando o governo e o Conselho Nacional Eleitoral, que são um só, divulgaram que a diferença era de 200 mil votos, nós, somando todas as mesas, sabíamos de irregularidades, de mortos que haviam votado, pessoas que votaram mais de uma vez. Dos centros de votação, retiraram fiscais. E o número dessas irregularidades era maior que a diferença anunciada. Dizer que Maduro ganhou a eleição de 2013 é falso. Quando há mortos que votam, a mesa onde isso ocorreu deve ser anulada. Haveria nova eleição, total ou em parte. Maduro não ganhou e sabe disso. Preside porque controla a institucionalidade.

O governo costuma se confundir com a ideia de “pátria”. Que leitura o senhor faz disso?

Na Venezuela, é assim. O público é como se fosse deles, não de todos.

Como o senhor define o governo de Nicolás Maduro?

É um governo corrupto em todos os sentidos, impopular, que se sustenta pelo controle da cúpula dos poderes. Mas caminha sobre piso de vidro, que a qualquer momento vai quebrar. Não dá para se dizer que haja democracia plena. É, muitas vezes, um governo fascista, um monstro. A melhor maneira de definir o governo é a de um monstro, que é algo negativo. A visão da Venezuela, hoje, é só negativa. Temos a inflação mais alta do mundo, a escassez mais alta, uma das maiores violências, a pobreza voltou ao ponto de quando Chávez assumiu a presidência. A pobreza na Venezuela cresce. Não se acha algo positivo no governo.

A opressão é maior em relação aos governos de Chávez?

Cada vez pior. O governo tem como último recurso a repressão. Perdeu a popularidade, e Nicolás não tem a liderança de Chávez. Resta-lhes oprimir para sustentar o poder. Quanto dura isso? Não sei. O piso de vidro sobre o qual o governo caminha não é grosso, é fino.

Em 2016, pode haver o referendo revogatório. Maduro foi eleito sob a comoção da morte de Chávez, e a situação piorou.

Antes do referendo, temos eleições parlamentares, para o Congresso. Caso a oposição ganhe e a vitória seja reconhecida, a eleição provocará mudança, abrirá caminho para o referendo revogatório.

Se o referendo fosse hoje, Maduro teria mandato revogado?

Apesar de em tese o referendo em meio ao mandato ser democrático, não será fácil chegar a isso. O governo imporá obstáculos no recolhimento das assinaturas e na materialização da votação. Mas suponhamos que ocorra. Maduro não ganharia. Perderia bem perdido, com resultado folgado.

São necessários 20% dos eleitores. Que obstáculos haveria?

O governo domina o órgão eleitoral e determinaria que o eleitor pusesse impressões digitais, tirasse foto, o intimidaria. O recurso que resta ao governo é impor medo. Usa isso diariamente. Com medo, as pessoas se paralisam.

Como a eleição legislativa muda um país presidencialista?

O Congresso define quem ocupa o Conselho Eleitoral, o poder eleitoral. Também aprova o orçamento, autoriza créditos, pode investigar, define procurador-geral. Tem o poder de equilibrar.

Foi pensando nessas eleições que o governo aprovou a Lei Habilitante, para governar por decretos em temas de segurança?

A Lei Habilitante anti-imperialista é atitude ridícula de Maduro. As sanções de Obama não são contra a Venezuela ou os venezuelanos. É problema com autoridades e testas-de-ferro, que têm contas e propriedades nos EUA. Não está em questão invasão ou bloqueio econômico à Venezuela.

Mas há um fato: o governo pode governar por decretos.

Claro. O governo pediu essa lei para nos distrair dos problemas reais. Talvez vocês no Brasil não tenham ideia do que é essa escassez de artigos de primeira necessidade. Mas, sim, a lei pode ser usada para perseguir, reprimir, golpear a eleição parlamentar, que está perdida para eles, com base no amedrontamento e na repressão.

Há mais antiamericanismo?

Se perguntares aos venezuelanos sobre os EUA, vão perguntar por quê. Nas ruas, ninguém fala em “império”, em Obama. Falam em escassez, em falta de água, desemprego, falta de dinheiro. E há discurso duplo do governo. Se são tão anti-imperialistas, por que ainda vendem petróleo para os EUA? Por que compram arroz para o pabellón criollo, que é como a feijoada no Brasil? O arroz do pabellón criollo é “gringo”. Chávez tinha esse discurso para ser herdeiro do Fidel Castro. Maduro talvez queira apoio. Mas se equivoca. O venezuelano quer que nosso país tenha boas relações com os demais países, para atrair investimentos, recursos. O discurso de Maduro é para os 20% que ainda o apoiam.

Esse discurso antiamericano e o discurso que fala em tentativas de golpe seriam pretexto para evitar a eleição legislativa ou para um autogolpe?

Estamos em alerta para vermos se querem usar a Lei Habilitante a fim de atingir a eleição. Não descarto. A eleição parlamentar decide o poder na Venezuela. Não a presidência, mas o poder.

Voltaria a democracia plena?


Pode não devolver a democracia, mas equilibra. Não de um dia para o outro, mas começa a equilibrar a situação na Venezuela.

O petróleo representa 96% das divisas venezuelanas, e há desabastecimento. O que fazer?

Diversificar. O petróleo pode ser a alavanca para o desenvolvimento da Venezuela, é estratégico. Mas não podemos viver exclusivamente dele. A renda do petróleo é insuficiente. Só em 2014, passamos a ter mais 2 milhões de pobres. Mais da metade do país está em situação de pobreza. Precisamos desenvolver outras áreas da economia. A Venezuela poderia produzir todos os alimentos. Hoje, 70% dos alimentos são importados. Um país não pode importar 70% da comida, isso é inviável.

Essa falta de alimentos atinge a faixa da população que costumava apoiar o chavismo?

Somos mais de 15 milhões de pobres, em uma população de 30 milhões. Por isso, o presidente tem hoje só 20% de popularidade.

Sua candidatura na próxima eleição presidencial é natural?

Não penso nisso agora.

Quem acompanhou a eleição de 2013 ficou com a sensação de que o senhor chegaria com potencial para a próxima.

Lula chegou à presidência na quarta chance, e veja o projeto que construiu e a força que conseguiu. Sou democrata e quero a união do país. E, para mudar o país, deve-se incluir os mais pobres. A responsabilidade é humana.

O governo diz que há golpistas na oposição. É verdade?

Tanto no governo quanto na oposição há setores extremistas. Há golpistas dos dois lados. São a mesma coisa. Assim como haverá extremistas que querem violência e um golpe, há no governo. O que me tranquiliza é que esses setores são minoritários. A mudança na Venezuela será pacífica, democrática, constitucional e eleitoral.

Os extremistas dos dois lados se alimentam mutuamente?

Sim. Aos extremistas do governo, lhes interessa que se escute a voz dos extremistas da oposição. O governo quer que apareçam, que tenham espaço na imprensa.

E as prisões de opositores?

Prisões políticas não se justificam. Na democracia, não pode haver presos políticos. Quando falamos de presos políticos, falamos de totalitarismo, de ditadura.

O governo pode usar isso para evitar as eleições legislativas?


O governo usa os presos políticos para meter medo e para desmoralizar a oposição. Mostra presos políticos como troféu, indicando não haver saída eleitoral, instando a oposição a deixar o rumo democrático. Temos que resistir e avançar, mas nunca saindo do caminho democrático, de vencer eleitoralmente. Querem etiquetar a oposição de não democrática.

Para justificar um autogolpe?

Quem sabe? Desse governo, creio em qualquer coisa. Sabem que perderam popularidade, e não há sinais de recuperação. Restam os atalhos, a arbitrariedade. São capazes de tudo para manter o poder. Não significa que vão manter.

Com petróleo desvalorizado, países vizinhos antes ajudados tendem a se distanciar?

Sim. Mais que isso. Os países como o Brasil sabem do pouco apoio popular que Maduro tem hoje.

Uma solução democrática no país terá apoio internacional?


Creio nisso e faço um apelo. Já falei com dois chanceleres do Brasil, Luiz Figueiredo e Mauro Vieira (atual). Peço que insistam em que a saída na Venezuela seja constitucional, democrática e eleitoral. Que haja condições para isso. Não que o Brasil se meta nos assuntos da Venezuela, eu não permitiria e não me meteria nos do Brasil. Mas o Brasil tem de insistir no jogo democrático. Em 2013, poderia ter sido mais ativo em vez de silenciar.

O Brasil tem sido omisso?

Estou insatisfeito. O Brasil guarda silêncio em muitas coisas. A Venezuela não só faz parte da América do Sul, é vizinha e irmã. Discordo do silêncio brasileiro. O Brasil tem responsabilidade além das relações entre dois presidentes, como havia entre Lula e Chávez. Tem um peso, na região, que precisa se fazer sentir pela democracia. Tem seus problemas, mas não pode ser indiferente frente a um país vizinho em conflito. A indiferença tem custo interno no próprio Brasil. Os brasileiros gostariam que o Brasil fosse uma ponte para a Venezuela resolver seus problemas.

O senhor pediria isso agora?

Já falei aos chanceleres Figueiredo e Mauro. Volto a pedir, sim. Sempre pedi à presidente Dilma que ajude no diálogo da Venezuela. O problema da Venezuela não pode ser indiferente ao Brasil, porque pode repercutir em toda a região, incluindo o Brasil. O Brasil cuida mais de estar bem com o governo venezuelano do que com o povo venezuelano.

No Brasil, há protestos. Alguns pedem impeachment.

Digo, com o maior respeito e consideração, que a situação da Venezuela pode afetar o Brasil se mal conduzida. É uma bola de neve. Nossos países têm de buscar saídas constitucionais, eleitorais, pacíficas, democráticas. Nossa região já teve muito abuso de poder e corrupção. Foi afetada por golpes e vive uma aprendizagem. Há leis, e elas devem ser respeitadas. Ninguém pode se afastar da Constituição. Maduro não se compara a Dilma. Maduro está no poder com eleição questionada, em que o Brasil podia ter ajudado a resolver, mas nada fez. Dilma não foi reeleita com eleição questionada. Não quero que Maduro seja derrubado, quero a mudança incluindo Maduro. Nunca com golpes e atalhos.

Nenhum comentário: