Revelamos aqui as causas e efeitos da insegurança pública e jurídica no Brasil, propondo uma ampla mobilização na defesa da liberdade, democracia, federalismo, moralidade, probidade, civismo, cidadania e supremacia do interesse público, exigindo uma Constituição enxuta; Leis rigorosas; Segurança jurídica e judiciária; Justiça coativa; Reforma política, Zelo do erário; Execução penal digna; Poderes harmônicos e comprometidos; e Sistema de Justiça Criminal eficiente na preservação da Ordem Pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

ROTINA E RECRUTAMENTO DE JOVENS EUROPEUS NO ESTADO ISLÂMICO

G1 FANTÁSTICO Edição do dia 25/01/2015


Jornalista francesa se alista disfarçada no Estado Islâmico. Francesa mostra em documentário a rotina dos combatentes e como o grupo recruta jovens europeus para o terror.





Uma jornalista francesa investigou e descobriu: homens que treinavam luta numa praça de Paris pertenciam ao grupo terrorista Estado Islâmico, que ficou conhecido por decapitar seus prisioneiros.

O documentário que o Fantástico exibiu é o resultado do trabalho corajoso dessa jornalista. Ela se disfarçou, conseguiu se alistar no Estado Islâmico e mostra como o grupo recruta jovens europeus para o terror.

Outubro do ano passado. Crianças brincam numa pracinha de Paris. Entre pais e policiais, um grupo de homens barbados treina técnicas de combate. Eles praticam mesmo à noite ou debaixo de chuva. Poderiam ser apenas atletas dedicados. Mas alguma coisa os faz diferentes. Depois de encerrarem o treino, eles rezam. E a conversa deles revela planos suspeitos.

Extremista1: Ele já foi para a Síria.
Extremista 2: Eu mesmo já fui duas vezes.

A Síria é o berço do Estado Islâmico, o exército terrorista mais agressivo hoje no Mundo. Os extremistas se aproveitaram do vazio de poder criado pela guerra civil e dominaram um terço do país, além de grandes áreas no Norte do Iraque, inclusive campos de petróleo que hoje são usados para financiar o terrorismo.

As ações do Estado Islâmico são difundidas na internet. Vídeos que mostram barbarismos. Assassinatos em massa. Alguns para provocar o Ocidente - como as decapitações de reféns. Outros para exibir a força do grupo.

E a internet também é um instrumento de recrutamento. Usada pelo grupo francês para atrair seguidores dispostos a partir para a Síria para fazer a Jihad, a Guerra Santa contra o Ocidente.

Um dos homens que treinava no parque é Abu Aissa. Ele publica fotos de suas ações, sempre com armamento pesado. Mostra até um passaporte do Estado Islâmico. O outro, Abu Abdel Malik, um francês que vive na Síria e, em vídeo, faz ameaças contra a França, dizendo que será alvo de novos atentados.

“Nós vamos vingar todo o sangue islâmico.”, diz Malik

A arrogância do Estado Islâmico está montada sobre um exército muito bem organizado, 30 mil homens com equipamento militar moderno: misseis, artilharia, tanques e três aviões caça. Tudo roubado da Síria. Cada combatente recebe um salário do Estado Islâmico. Alguns chegam a ganhar um carro. Uma tentação para os muçulmanos pobres das periferias de Paris. Os franceses são os mais numerosos entre os ocidentais que se integram ao Estado Islâmico.

A partir das páginas nas redes sociais, usando um perfil falso, uma jornalista francesa chegou aos recrutadores extremistas. Ela não será identificada por segurança.

Em três dias, a jornalista já estava associada a diversos grupos. E tinha 273 amigos. Principalmente combatentes na Síria e no Iraque. Um deles conta o dia a dia no Estado Islâmico. Ele chegou a publicar uma foto comemorando sua primeira vítima. Os terroristas exibem também uma vida de luxo: roupas, carros e mansões tomadas pelo grupo.

Para se aproximar dos jihadistas, a jornalista diz que está disposta a se casar com um radical quando chegar na Síria. Ela começa a conversar com Abu Tak Tak. Para se encontrar com ele, ela se vestiu com um chador, usada por alguma das mulheres muçulmanas: totalmente coberta de preto, como determina o costume do Islã. Num café da periferia de Paris, ela encontra o terrorista.

“Você está toda de preto. Eu adoro preto”, diz ele.

Abu Tak Tak tem 37 anos. Diz que nunca trabalhou. Ele conta que o Estado Islâmico paga as contas dele. “Eles me mantêm desativado por enquanto", diz.

Pronto para entrar em ação.

“A França tem medo de quê? De que a gente se exploda.”

Ele acredita que a França merece ser alvo de um atentado. Exatamente o que aconteceu no dia 7 de janeiro, quando outro grupo terrorista, a Al-Qaeda do Iêmen, matou 12 pessoas no atentado contra a revista Charlie Hebdo.

Um segundo homem fez contato com a jornalista. Esse já estava na Síria. É um combatente ativo do Estado islâmico. Ele faz uma proposta curiosa: casar-se com ela pela internet com as bênçãos de um imã, um líder religioso. Ela faz contato com o jihadista, que explica o que ela deve fazer: “Vá para Istambul, na Turquia. De lá eu direi o que deve fazer”.

Depois de muitos contatos como esses, a jornalista chegou ao homem que é o líder dos recrutadores para o Estado Islâmico na França: Aba Souleyman. Na página dele na internet, um manual de como atravessar a fronteira da Turquia com a Síria sem chamar a atenção da polícia. Por exemplo, levar pouca bagagem, pois a travessia é feita a pé.

Aba Souleyman tem 25 anos e é casado, mas propõe à jornalista que ela seja a segunda mulher dele na Síria. Ele indica uma mesquita secreta numa cidade no Leste da França, base de operações para os recrutadores do Estado Islâmico. Um deles é Nicolas, que no elevador faz uma revelação aterrorizante: “Em Paris, nós somos muitos”.

Numa das salas, as paredes estão cobertas de bandeiras do Estado Islâmico.
Ele conta que participou de uma ação do grupo numa cidade curda, no Norte do Iraque: "Matamos as mulheres cortando as gargantas”.

Nicolas não nasceu numa família muçulmana. Ele se converteu ao islã há três anos. E diz que vai partir para a Síria em duas semanas. A jornalista parte para a Turquia, o corredor mais comum para os recrutados europeus chegarem à Síria.

São apenas três horas e meia de voo entre Paris e Istambul. E um segundo voo para a cidade turca de Gazientep, próxima à fronteira. No hotel, ela entra em contato com os recrutadores que passam para ela os telefones dos homens que atravessam pessoas pela fronteira.

Do outro lado dessa cerca, é a Síria. A travessia termina na cidade síria de Raqqa, capital do Estado Islâmico. Duzentas mil pessoas vivem sob o domínio do Estado Islâmico desde junho de 2013. Em Raqqa, a jornalista gravou um desfile militar do exército terrorista, tanques e mísseis passavam pela rua. No centro da cidade, um inimigo do regime foi crucificado. E três são fuzilados diante de todos.

Nas ruas da cidade, impera a lei islâmica, a Sharia. Homens fazem as orações no meio da rua, guardas do Estado Islâmico andam com fuzis nos ombros, mulheres caminham totalmente cobertas. Dois homens do Estado Islâmico chamam a atenção dela.

Estado Islâmico:Nós conseguimos ver através do seu véu.
Jornalista: Desculpe, ele é um pouco transparente.
Estado Islâmico: Você precisa se cobrir melhor.
Jornalista: Certo, certo, desculpe.

Num cybercafé, a jornalista encontra diversas mulheres francesas conversando pela internet com suas famílias na França.

“Eu não vou voltar, mãe! Eu me arrisquei para chegar aqui e não vou voltar. O que a senhora vê na televisão é falso”, diz uma delas.

Daqui, os homens vão direto para os campos de treinamento do grupo. Nesses campos secretos, os ocidentais ganham uma nova identidade. Geralmente adotam um nome muçulmano. Foi o que aconteceu com o filho da brasileira Rosana Rodrigues. Brian de Mulder, agora é conhecido como Abu Qassem Brazili, ou Abu Qassem Brasileiro.

Outro brasileiro, Kaíque Guimarães, que morava na Espanha, foi detido na Bulgária, tentando chegar até os campos do Estado Islâmico. Nesses lugares, os jihadistas são endurecidos no combate e viram máquinas de guerra.

Todas as semanas, dezenas de jovens europeus fazem esse mesmo caminho para engrossar as colunas do Estado Islâmico. E virar soldados de uma guerra dita santa, que distorce os princípios da religião islâmica e se torna retrato da barbárie e da ignorância.

domingo, 25 de janeiro de 2015

A EDUCAÇÃO CUBANA EM 18 IMAGENS

Spotniks

Spotniks, 02 de outubro de 2014


Separamos 18 imagens que mostram como a educação é usada como propaganda ideológica no país mais fechado do continente americano.

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A educação cubana é um dos trunfos que vira e mexe rondam a retórica dos defensores do seu modelo econômico como uma das melhores do planeta.

Mas não é nossa intenção aqui apontar o fato de que não há uma mísera universidade cubana entre as 500 melhores do mundo. Ou então dizer que no Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, no quesito educação, o país apareça apenas numa posição mediana, empatado com o Panamá – e atrás, entre outros, de países como Uruguai, Argentina, Barbados e Chile, o líder do continente latino americano, duramente criticado pelo seu modelo privado de educação. Ou elogiar as informações oficiais de que a taxa de analfabetismo no país esteja próxima do zero – assim como países como Letônia, Antígua e Barbuda, Armênia, Andorra e Tajiquistão; isso para não citar os países desenvolvidos. Também não precisamos abordar o fato de que não há um mísero Nobel, uma Medalha Fields e uma Medalha Copley na história de Cuba, citar que a produção acadêmica no país é menor que a de Bangladesh e dizer que no ranking da World Intellectual Property Organization, o país apareça na lista com apenas 10 patentes registradas em 12 meses.

Cuba é uma ditadura e seus dados oficiais não são confiáveis – como os dados de qualquer ditadura. Não há como avaliar a educação do país simplesmente pelo fato dele não possuir indicadores globais especializados em educação - não há dados sobre Cuba no ranking do PISA e de outros exames internacionais respeitados. Mas apesar da muralha, há claros indícios de que ela seja utilizada no país para propagar seus governantes no poder (e você pode conferir em vídeo aqui, aqui e aqui).

Nessa série especial, separamos 18 imagens que mostram como a educação é usada como propaganda ideológica no país mais fechado do continente americano – a terra dos Castros.

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O PROCURADOR QUE INCOMODAVA CRISTINA KIRCHNER




ZERO HORA 25 de janeiro de 2015 | N° 18053


NILSON MARIANO | Enviado Especial/Buenos Aires

UM PROMOTOR ADEPTO DA VIDA ZEN


AO LADO DE NÉSTOR, CONTRA CRISTINA. PIVÔ DO MAIS sangrento e misterioso episódio da história recente da Argentina, o promotor Alberto Nisman, que foi encontrado morto com um tiro no crânio, passou de aliado a inimigo do oficialismo da família Kirchner


A morte do promotor federal Natalio Alberto Nisman instalou a maior crise política nos 11 anos de governo do casal Kirchner. Desde a madrugada de segunda-feira, os argentinos se debatem em torno de uma dúvida que já ganha contornos de mistério: foi suicídio ou assassinato?

Mas quem era Alberto Nisman – preferia não ser chamado de Natalio –, encontrado morto com um tiro na cabeça no apartamento onde morava, no elegante bairro de Puerto Madero, em Buenos Aires? Aos 51 anos, divorciado, pai de duas filhas, portava-se como um portenho de hábitos singulares. No exercício da profissão, mostrava-se em ternos sóbrios, as gravatas com detalhes em azul (cor símbolo do país), nos tons claro ou escuro. Considerado um promotor corajoso, não aliviava com os poderosos à margem da lei.

Na vida privada, Nisman mudara de estilo. Devido a uma lesão lombar, abandonara as corridas. Estava maravilhado com os efeitos do método zen de se exercitar. Quase todos os dias, concentrava-se como um monge no ritual da respiração hindu: inalar, reter o ar e exalar. Quando a agenda permitia, tratava de seguir os ensinamentos do livro A Arte de Viver.

Era de família abastada o promotor que morreu às vésperas de apresentar denúncia contra a presidente, Cristina Kirchner, em razão do atentado terrorista contra a sede da Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), em 1994, na capital do país. O pai, empresário do ramo têxtil, patrocinou o curso de Direito na Universidade de Buenos Aires. Estudioso, tinha notas acima de oito.

No condomínio onde Nisman vivia, o Le Parc Puerto Madero, o clima é de consternação. Uma pequena faixa, afixada na guarita de entrada com cadarços de tênis, expõe um clamor: “Justiça”. Num dos postes, hastearam a bandeira nacional a meio pau, em sinal de luto. O automóvel do promotor, um Audi, está à vista, exibindo o lacre de apreendido da Polícia Federal.

Os vizinhos de Nisman saem apressados das torres residenciais, levando seus cães, sem olhar para os repórteres diante do condomínio. Na manhã de sexta-feira, ao ser abordada, uma jovem parou e tirou os fones de ouvidos para conversar. Quando soube do assunto, desculpou-se.

– Sinto, não quero falar.

A carreira de Nisman deslanchou justamente durante o governo do clã Kirchner. Em 1997, era apenas um dos promotores que investigavam o atentado contra a Amia, que deixou 85 mortos. Em 2004, o recém-empossado Néstor Kirchner o designou para chefiar as apurações, com plenos poderes.

Nisman foi a fundo. Logo descartou uma eventual participação da Síria, apostou que as bombas contra a instituição judaica foram acionadas por criminosos do Irã. Em 2008, surpreendeu o país ao pedir a detenção de ninguém menos que o ex-presidente Carlos Menem. Acusação: obstruir as investigações e fabricar provas falsas.

Foi a partir daí que o promotor começou a colecionar inimigos ocultos e a se enredar na teia de intrigas que move a política argentina. Disseram que tentou inculpar Menem para cair nas graças de Cristina Fernández de Kirchner, a sucessora do marido, Néstor. O objetivo, segundo os maledicentes: conquistar a chefia da Procuradoria Geral da Nação.

O promotor, porém, mostrou que não era manipulado pelos cordéis do kirchnerismo. Afastou-se de Cristina quando o governo firmou um pacto com o Irã, em 2013. Entendeu que a mandatária pretendia encobrir os autores ideológicos do atentado antissemita, em troca de compensações econômicas por parte de Teerã.

O escritório de Nisman, na Promotoria Federal do Caso Amia, é vizinho ao gabinete de Cristina na Casa Rosada. Ambos estão de frente para a Praça de Maio, no coração de Buenos Aires. Soldados com armas pesadas guardam o local.

Os colegas de Nisman também emudeceram, pelo menos na sexta-feira, quando foram procurados. Porteiros esclareceram que nenhum jornalista poderia entrar no prédio. Os promotores estão estarrecidos com a morte, que ocorreu quando faltavam 12 horas para Nisman denunciar a presidente Cristina e o seu chanceler, Héctor Timerman, no Congresso Nacional.


À sombra da Side

Se houve crime na morte de Alberto Nisman, uma organização precisará ser investigada: a Secretaria de Inteligência de Estado (Side). Herança da ditadura militar (1976-1983) da Argentina, a mais sangrenta da América do Sul por ter produzido cerca de 30 mil mortos e desaparecidos, a sinistra Side não foi totalmente desmontada com a redemocratização. Numa situação difícil de entender, auxiliava a equipe de Nisman nas investigações sobre o atentado antissemita contra a Amia.

O promotor era próximo do homem forte da Side, Antonio Stiusso, o Jaime. Temido nos subterrâneos da espionagem, Stiusso foi afastado do organismo em dezembro, depois de várias tentativas de parte de Cristina Kirchner. A partir de então, coincidência ou não, aumentaram as inquietações de Nisman.





UM DIA QUE NÃO TEVE FIM

HAMILTON ALMEIDA* | Especial *

O maior atentado terrorista da história argentina – e segundo maior das Américas, só ficando atrás do tristemente célebre 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos – deixou feridas que não cicatrizam e voltam a sangrar, clamando justiça. Aquela segunda-feira, 18 de julho de 1994, amanheceu como um dia normal, ensolarada e um pouco fria. No centro de Buenos Aires, muitos já estavam trabalhando, outros tomavam café com medialunas nos bares e comentavam sobre futebol, uma das paixões argentinas.

No dia anterior, a Seleção Brasileira sagrara-se tetracampeã, nos Estados Unidos, ao derrotar a Itália nos pênaltis. Esse foi o assunto que levou o jornalista Lasier Martins, da Rádio Gaúcha, a fazer uma entrevista ao vivo comigo, então correspondente de Zero Hora em Buenos Aires. Comentei que havia visto uma pelada de guris em frente ao edifício da Embaixada do Brasil, uns vestindo a camiseta amarela, outros a azul celeste ou qualquer cor, tudo misturado. Felizes. No mais, os argentinos ainda estavam melancólicos com a desclassificação precoce da sua equipe, nas oitavas de final, após um caso de doping do ídolo Maradona, que jogava sua última Copa.

Por volta das 10h, escutei a Rádio Mitre divulgar em poucas palavras que havia ocorrido um atentado contra a Associação Mutual Israelita Argentina (Amia): “É lamentável. Mais uma vez...”, anunciou o locutor. Para checar, liguei para a sede da instituição judaica. Nunca pude esquecer aquele desesperado som de “chama e ninguém atende”. Foi então que a manhã, que eu imaginava morna, se transformou em um pesadelo. Saí do escritório da RBS, na Rua Reconquista, e peguei um táxi. Na Avenida Córdoba, depois do Obelisco, o trânsito incomum já refletia o drama que ocorria poucos quilômetros adiante.

Desci do automóvel e fui caminhando e correndo até a Rua Pasteur, 633. Às 9h53min, uma caminhonete Renault Trafic carregada com uma quantidade estimada entre 300 e 400 quilos de um composto de nitrato de amônio, alumínio, hidrocarboneto pesado, TNT e nitroglicerina explodiu em frente ao edifício da comunidade judaica, provocando a morte de 85 pessoas e ferimentos em outras tantas.

UMA NUVEM DE PÓ PAIRAVA NO AR. E A DOR, MUDA

Cheguei à cena de guerra às 10h30min. O cadáver de uma mulher com uma roupa modesta, um vestido colorido, estava estirado na calçada, a uma centena de metros do local da explosão do carro-bomba, refletindo a insanidade do ato terrorista. Ela certamente estava passando por ali quando tudo aconteceu. O edifício era uma montanha de escombros, e uma dezena de pessoas já se dedicava a buscar sobreviventes. Uma nuvem de pó pairava no ar. E a dor, muda.

Aproximei-me o mais que pude para, depois, poder escrever. Ao mesmo tempo, imagens de pessoas que conhecia vinham martelando a minha cabeça. Estariam mortos? A angústia seria em parte sanada nos dias seguintes da cobertura. Traumatizados e desconfiados, talvez tenham julgado mal o sorriso no canto dos lábios que esbocei ao revê-los. Quem eu nunca mais vi sorrir foi a jovem Marisa Raquel Said. Tinha uns 21 anos e trabalhava na recepção da Amia. Talvez a sua última imagem na Terra tenha sido a aproximação suspeita da Trafic.

Foi ela quem me atendeu, simpática, meses antes, quando fui fazer uma reportagem sobre os nazistas na Argentina. Os arquivos estavam lá, no quinto andar. Vi documentos de vários deles, como o médico de Auschwitz, Josef Mengele, que morou a algumas quadras do Obelisco, quando chegou à Argentina de Perón, ocupou outras residências em suas constantes fugas até que morreu em Bertioga (SP).

Dois anos antes da Amia, em 17 de março de 1992, a Argentina havia sofrido outro atentado terrorista, que destruiu a embaixada de Israel, na Rua Arroyo, centro, matando 22 pessoas. “Por que a Argentina na rota do terror internacional?”, se perguntava. Também tive a oportunidade de fazer a cobertura para ZH desse evento, que permanece impune.

Desde aquela época, já circulava entre a imprensa que o Hezbollah, a serviço do Irã, estava por trás de tudo. Procurei várias vezes ouvir uma autoridade do Irã em Buenos Aires, Mohsen Rabbani, conselheiro cultural da embaixada. Ele nunca atendeu: fugiu do país e tem mandado de prisão da Interpol. Na denúncia de Alberto Nisman, Rabbani é acusado de participar das negociações comerciais com as autoridades argentinas envolvidas no plano macabro. Ele interveio, escreveu o promotor, para garantir a própria impunidade. O ciclo se fecha?

 Hamilton Almeida foi correspondente de Zero Hora em Buenos Aires de 1994 a 1995



sábado, 24 de janeiro de 2015

MISTÉRIO ARGENTINO

REVISTA ISTO É N° Edição: 2356 | 23.Jan.15


Como a morte do promotor Alberto Nisman, na véspera de depor no Congresso contra a presidente Cristina Kirchner, dificulta ainda mais os planos do governo em um ano de eleições presidenciais

Mariana Queiroz Barboza





A feita às grandes tragédias melodramáticas que povoam as letras de seus tangos mais desbragados, a Argentina está atônita diante de um mistério policial ao melhor estilo de Agatha Christie. Entre os personagens principais dessa trama estão a presidente Cristina Kirchner, agentes secretos iranianos e o promotor federal Alberto Nisman, encontrado morto com um tiro na cabeça no banheiro de seu apartamento na madrugada da segunda-feira 19. Como todo bom romance policial, uma série de perguntas permanecem sem resposta e, a cada dia, a tese de que Nisman, um inimigo declarado de Cristina, se suicidou, como apontaram as autoridades policiais antes mesmo de o corpo do promotor esfriar, fica mais fraca. Na quinta-feira 22 a própria presidente argentina declarou que não acreditava mais na tese de suicídio. “Ele foi morto para prejudicar o governo”, afirmou Cristina Kirchner em um texto publicado em seu blog. Tudo isso a menos de nove meses das eleições que vão escolher o próximo presidente do país.


DÚVIDA
Mais de 70% dos argentinos não creem que Nisman se suicidou

Faltavam poucas horas para o promotor federal Alberto Nisman depor no Congresso argentino sobre uma denúncia que havia feito contra o governo, quando foi encontrado morto. Nisman passara os últimos dez anos em dedicação exclusiva à investigação de um atentado à principal associação judaica do país, a Amia, ocorrido em 1994. Na denúncia, ele concluía que os responsáveis pela morte de 85 pessoas eram terroristas iranianos e acusava a presidente Cristina Kirchner e o chanceler Héctor Timerman de acobertá-los com o objetivo de fechar acordos comerciais vantajosos com o Irã.

A morte de Nisman suscitou suspeitas quase de forma imediata, principalmente pela decisão apressada das autoridades em determinar que o procurador havia cometido suicídio. Nisman não dava nenhum sinal de que pretendia tirar a vida. No lugar de uma carta de despedida, em seu apartamento havia apenas uma lista de compras. Em vez de convocar a cadeia nacional de rádio e tevê, como costuma fazer, Cristina se pronunciou apenas por uma mensagem. “Um suicídio provoca, em primeiro lugar, estupor e depois perguntas”, escreveu.

No mesmo dia, milhares de pessoas foram às ruas fazer essas perguntas. Uma pesquisa do instituto Ipsos mostrou que 70% dos argentinos acreditam que Nisman foi assassinado e, para mais da metade deles, o governo é o responsável pelo crime. “O mais difícil será o governo provar que não tem nada a ver com isso para o imaginário coletivo, e não para a Justiça”, disse à ISTOÉ o analista político Raúl Aragón.



Cristina Kirchner seria acusada formalmente
por Nisman, no Congresso, na segunda-feira 19

O clima de desconfiança piorou quando a promotora Viviana Fein, que conduz as investigações da morte de Nisman, disse que “lamentavelmente” não foram encontrados vestígios de pólvora na mão da vítima. Outros pontos mal explicados aumentaram as dúvidas. O chaveiro que abriu o apartamento, a pedido da mãe de Nisman, disse que a porta de serviço não estava trancada e qualquer pessoa poderia tê-la aberto, contrariando a informação inicial de que o apartamento do procurador estava trancado por dentro. Ao “Clarín”, jornal oposicionista, Nisman havia dito que temia ser morto. Na quinta-feira 22, a presidente argentina mudou de ideia e se disse convencida de que se tratava de um assassinato.

Ainda é cedo para se descobrir o que de fato aconteceu com Nisman, mas, pela velocidade com que novos fatos têm vindo à tona, tudo parece levar a crer que o procurador não decidiu tirar a vida. Mas, independentemente da descoberta da verdade, uma coisa é certa: a morte de Nisman ficará ligada de forma indelével à atual presidente argentina.





21 anos depois, atentado não foi esclarecido



Com a maior comunidade judaica da América Latina, a Argentina nunca esqueceu o ataque à sede da Associação Mutual Israelita Argentina, em Buenos Aires, ocorrido na manhã de 18 de julho de 1994. A explosão de um carro-bomba deixou 85 mortos e mais de 300 feridos no local. O caso, no entanto, sofreu com a destruição de provas e nunca foi encerrado. O atentado terrorista teria sido orquestrado pelo grupo libanês radical Hezbollah e pelo governo do Irã, com a ajuda de policiais argentinos. Em 2006, a Justiça responsabilizou cinco iranianos e um libanês pelo ataque: todos funcionários do alto escalão do governo ou da Embaixada do Irã em Buenos Aires. O grupo é procurado pela Interpol (polícia internacional) desde então, mas ninguém foi preso. O país persa sempre se negou a colaborar com as investigações.

Fotos: Marcelo Capece, Juan Mabromata- afp; Alejandro Pagni/ap

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

O LEGADO DO ILUMINISMO



ZERO HORA 19 de janeiro de 2015 | N° 18047



LÍCIA PERES




A marcha contra o terrorismo realizada em Paris, que uniu lideranças do Ocidente e do Oriente, pode ser um indicativo de um caminho a seguir. Todo esforço deve ser feito para que a justiça prevaleça e os fanáticos fundamentalistas não encontrem campo fértil para plantarem seu ódio ou arregimentarem asseclas.

Discordo das medidas preconizadas pela extrema-direita Frente Nacional, presidida por Marine Le Pen. Não são o melhor caminho. Longe disso. A adoção da pena de morte, o fechamento das fronteiras e a deportação de imigrantes, pelo fato de serem muçulmanos, equivale a responder a uma barbárie com outra.

A islamofobia que já se dissemina na Europa, assim como o antissemitismo, precisam ser contidos com valores culturais que têm raízes profundas no Iluminismo. Admiro a história francesa. Sua luta contra a tirania, que levou em 1789 à queda da Bastilha, foi precedida e alimentada pelas ideias dos grandes filósofos, dentre os quais Voltaire, Diderot e Montesquieu, mártires contra a censura e a intolerância.

O farol do Século das Luzes (século 18) iria influenciar todos os grandes movimentos sociais na Europa e na independência das colônias inglesas na América do Norte.

O lema da Revolução Francesa, Liberdade, Igualdade e Fraternidade, foi o princípio inspirador da noção de cidadania. Confunde-se com a alma nacional e precisa ser preservado para que a essência dos valores humanistas não se perca.

O multiculturalismo, para mim, tem como limite a escravidão, o apedrejamento, a mutilação e a tortura.

O ataque à Charlie Hebdo foi um soco no estômago, assim como o tiro na cabeça da menina Malala, as atrocidades do Boko Haram e as ações que explodem seres inocentes.

O grande desafio é unir esforços para combater o terrorismo, reprimindo, rastreando suas possíveis células latentes, usando todos os atores à disposição para impedir seus crimes. A adoção de políticas sociais adequadas também precisa ser adotada para que não vicejem o ódio e o ressentimento.

A preservação dos valores do Iluminismo e dos direitos humanos não pode ser destruída. A luz não pode ceder à escuridão.

SOCIÓLOGA

GRUPOS TERRORISTAS MAIS PERIGOSOS

TV GLOBO FANTÁSTICO Edição do dia 18/01/2015


Conheça como agem e o que querem os grupos terroristas mais perigosos. Organizações internacionais estimam que os grupos façam mais de 200 vítimas por dia. Cientista político analisa a intenção desses grupos.




São muitos nomes, e muitas organizações extremistas atuando em regiões diferentes. Conheça como agem e o que querem esses grupos bárbaros que deturpam a religião islâmica e matam sem piedade: Al-Qaeda, Al-Qaeda do Iêmen, Estado Islâmico, Talibã, Boko Haram. Nomes estranhos, com significados geralmente pretenciosos, que foram se tornando comuns e assustadores desde que o maior atentado da história, numa manhã de terça-feira em Nova York, inaugurou um novo milênio. Uma época até agora marcada pelo embate entre terroristas islâmicos e o chamado Ocidente.

Os grupos fazem, em média, 20 ataques por dia. E é impossível calcular o número de vítimas porque muitas desaparecem em lugares onde o terror é a lei. Mas organizações internacionais estimam que sejam mais de 200 por dia.



Na última quarta-feira, o líder da Al-Qaeda do Iêmen, Nasser Bin Ali Al-Ansi, divulgou um vídeo dizendo que os terroristas que mataram os cartunistas do jornal francês, Charlie Hebdo, eram militantes do grupo.

A Al-Qaeda do Iêmen começou a ficar conhecida 15 anos atrás, no ataque que matou 17 pessoas no destroyer norte-americano "USS Cole". Era na época um braço da Al-Qaeda comandada por Osama Bin Laden. Mas como afinal esse grupo se organiza?

O jornalista iraquiano Ghaith Abdul-Ahad foi até o deserto iemenita para investigar. Ele negociou por meses para entrar na cidade de Jaar, o reduto da Al-Qaeda do Iêmen. Militantes do grupo ficam nos morros, armados até os dentes, vigiando a estrada.

Na entrada da cidade vazia, os radicais fincaram as bandeiras deles. São os mais de mil homens da Al-Qaeda do Iêmen que mandam no local. As escolas foram fechadas e as marcas da guerra deles aparecem em todo lugar.

A Al-Qaeda do Iêmen deixou de ser filial de Bin Laden e virou referência para terroristas. Combatentes da Somália, da Arábia Saudita e do Afeganistão vão a Jaar em busca de uma base de operações. Em um cinema improvisado, em uma praça, não passa filme nenhum. A diversão do povo é ver vídeos de ataques terroristas.

Significado de Al-Qaeda

O jornalista Ghaith teve os olhos vendados ir até o chefe da Al-Qaeda do Iêmen, Jalal Al-Marqashi. Mas não pôde gravar o encontro.

Em Aden, principal porto do Iêmen, Ghaith foi testemunha do medo. No enterro de uma menina de 15 anos, terroristas atiram do alto de um morro. Dias antes um homem havia sido morto e crucificado. O corpo ficou exposto por três dias, para dar exemplo e causar pânico.

A Al-Qaeda do Iêmen quer que todo o mundo siga a lei islâmica e pretende eliminar ou converter os que não acreditam no Islã. É a dissidência mais ativa entre os grupos que se separaram da Al-Qaeda original depois da morte de Osama Bin Laden.

Al-Qaeda quer dizer "a base". Surgiu em 1988, na Arábia Saudita, e foi a primeira a internacionalizar o terror, criando uma rede com células espalhadas pelo mundo inteiro. Uma estrutura descentralizada que tem hoje cerca de 20 mil militantes.

Base de atuação do Talibã é Kandahar no Afeganistão


Quando a Al-Qaeda fez o maior atentado terrorista da história, em 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, recebeu apoio do Talibã, o grupo radical que chegou a ser governo no Afeganistão entre 1996 a 2001, até que foi derrubada durante a campanha militar americana para encontrar Osama Bin Laden.

Hoje, a base de atuação do Talibã é Kandahar, no Afeganistão. O grupo mantém forte influência no país e também no noroeste do Paquistão, onde mantém campos de treinamento de terroristas. O Talibã combate o governo do Afeganistão para voltar ao poder. Mas é só uma fração do que já foi no passado.

Estado Islâmico é o grupo terrorista que mais assusta hoje

O grupo terrorista que mais assusta hoje é o Estado Islâmico. Nos últimos três anos e meio, os extremistas se aproveitaram do vazio de poder criado pela guerra civil da Síria e tomaram grandes áreas, inclusive campos de petróleo que ajudam a financiar o terrorismo.

Hoje, o Estado Islâmico domina mais de 30% da Síria e avança sobre o Iraque, onde domina, por exemplo, Mossul, a segunda maior cidade do país.

Quando entra em um novo território, os terroristas do Estado Islâmico matam muçulmanos de outras denominações, escravizam as mulheres, e tentam converter os cristãos. Quem não aceita, é executado. Eles querem criar um califado, um poder central para mandar em todos os povos muçulmanos. E em nome disso, cometem barbaridades. Atos de selvageria divulgados como troféu nos vídeos que eles espalham na internet.

Homens desarmados são caçados como se fossem bichos, em alta velocidade. Os militantes fazem fuzilamentos em série. Matam dezenas de pessoas de uma só vez, a sangue frio. E escolhem vítimas para fazer execuções que provoquem a ira dos governos do Ocidente.

O jornalista norte-americano James Foley foi o primeiro a ser decapitado diante das câmeras do Estado Islâmico. Mas já foram muitos. E agora um novo vídeo mostra um menino que parece não passar dos dez anos, aparentemente, matando dois homens. Supostamente, espiões russos.

O Estado Islâmico montou um aparato militar bem equipado e financiado. Tem 200 mil homens com armamentos modernos, inclusive quatro aviões caça. E consegue resistir até aos ataques aéreos dos Estados Unidos.

Boko Haram pratica barbárie para criar um califado e apavora o mundo

Na África, um outro grupo que pratica barbárie para criar um califado apavora o mundo. A Nigéria tem reservas enormes de petróleo e por causa disso é a maior economia do continente. Mas o norte, onde vive a maioria dos 80 milhões de muçulmanos do país, é pobre demais. E é nesse vazio que entra o terrível Boko Haram.

O nome do grupo já anuncia o seu propósito. Boko Haram quer dizer "educação ocidental é pecado". Eles querem acabar com a influência do Ocidente e pra isso atacam escolas, sequestram estudantes, matam professores e destroem os prédios.

As leis do Boko Haram às comunidades com extrema violência. Qualquer comportamento que seja considerado anti-islâmico pode ser punido com a morte, sem julgamento.

O líder Abubakar Shekau anuncia: “Perigo, perigo, perigo”, diz ele em um vídeo.

O Boko Haram se espalha também por Chade, Níger e Camarões. Esta semana, a Anistia Internacional divulgou imagens feitas por satélite mostrando uma área arrasada no nordeste da Nigéria. Ativistas dizem que 2 mil morreram no massacre.

E em um vídeo, aparece novamente o chefe Abubakar Shekau espalhando a filosofia terrorista. O Boko Haram quer tomar um pedaço do norte da Nigéria para fazer no local um novo país. Um califado, onde só a lei islâmica seja possível. Eles têm muito em comum com o Estado Islâmico. Invadem cidades, matam ou expulsam os opositores. Controlam, segundo estimativas, 20% da Nigéria.

Em abril de 2014, eles invadiram a cidade de Chibok e sequestraram 276 meninas em uma escola. O mundo acompanhou em choque. E desde, então, os terroristas do Boko Haram se tornaram mais e mais violentos. É impossível saber ao certo, mas estima-se que eles já tenham matado mais de 7 mil pessoas.

Esta semana, promoveram mais três ataques suicidas com bombas. Meninas de dez anos foram obrigadas a carregar os explosivos.

Maioria dos mulçumanos não apoia os extremistas

Existem mais de 1,6 bilhão de mulçumanos no mundo, e basta conversar com eles para ter certeza de que a maioria não apoia os extremistas. A religião que é muito forte na Ásia, na África e no Oriente Médio ensina que eles devem ser justos, devem respeitar as outras religiões e, principalmente, ser bons perante Alá, o deus para quem eles rezam por cinco vezes ao dia. Mas quando a violência é praticada em nome da religião, analistas não têm a menor dúvida, o que entra em jogo é o poder. O alto proclamado Estado Islâmico, os talibãs, as Al-Qaedas, o Boko Haram, o que eles pretendem é derrubar governos e construir impérios, o que alguns chamam de califados. O que certamente não tem nada a ver com o que os muçulmanos entendem ser a mensagem de Deus.

Cientista político explica que terroristas querem recuperar o poder

“O islamismo é uma religião que evoca paz, que evoca a preservação da vida. Que evoca o direito inalienável da liberdade de expressão. Então, nós de uma maneira definitiva não podemos utilizar o termo islâmico ou Islã, ou islamismo pra atos que ferem os princípios do islamismo”, diz Ali Zoghbi, vice-presidente da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil.

“A pretensão desses grupos extremistas é a reconstituição política desse califado e dessa hegemonia muçulmana sobre diversas terras, sonhando com o velho império muçulmano da Idade Média, que ia ali da Ásia central até a Espanha”, diz Márcio Scalercio, professor de Relações Internacionais.

Como explica o cientista político, os terroristas querem recuperar o poder que um dia os califas muçulmanos tiveram. E não é só uma volta aos tempos em que algumas religiões se confundiam com a tentativa de alguns povos de dominar o mundo. Os terroristas querem impor a lei da espada, querem um retrocesso ao que a humanidade tinha de mais bárbaro.

sábado, 17 de janeiro de 2015

NÃO IMPORTA A DISTÂNCIA DA ESTRADA

 
ZERO HORA 17 de janeiro de 2015 | N° 18045


RAFAEL DIEHL FABRÍCIO



O ser humano sempre possuiu sonhos de melhorar a sua vida e de sua família e, alguns, de alterar a situação de sua sociedade. A luta pela busca do que é importante para si é inerente ao homem e se constitui, muitas vezes, num dos valores mais nobres e belos existentes na essência de cada um.

Sonhos são necessários para termos objetivos na vida; para lutarmos com todas as nossas forças com a ideia de alcançar o que desejamos. Sem metas de vida, nos tornamos seres alienados, infelizes e que apenas contarão o tempo restante na Terra sem realizar nada para torná-lo especial. É preciso ter metas para podermos alcançá-las e, consequentemente, encontrar a felicidade.

Objetivos podem ser exemplificados pela vontade de se tornar um grande profissional na área escolhida, pelo desejo de constituir uma família e pelo sonho de viajar pelo mundo, conhecendo diferentes povos e aprendendo com sua cultura. O sonho mais nobre, contudo, e que provavelmente traz a maior satisfação possível, é a luta pela esperança de ajudar sua sociedade ou, quem sabe, mudar o mundo. Mahatma Gandhi, Nelson Mandela, Martin Luther King Jr. e Ernesto Che Guevara são exemplos de homens que corajosamente desafiaram a opressão que lhes era imposta e ajudaram, cada um à sua maneira, a construir um mundo diferente: um lugar mais justo, igualitário, livre da tirania e feliz.

O meio em que vivemos nunca é propício ao desenvolvimento de nossos sonhos. Sempre haverá algo ou alguém que tentará impedir a evolução da luta pessoal pelos objetivos de cada um. Contudo, devemos ignorá- los e seguir na busca pela felicidade. Apenas assim cumpriremos nosso dever como cidadãos e como seres humanos, e faremos nossa vida merecer ter sido vivida.

Vestibulando

DE OLHO NOS VIGIAS


ZERO HORA 17 de janeiro de 2015 | N° 18045


RODRIGO MÜZELL


Ainda sob o impacto dos ataques em Paris, na semana passada, o primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, deu uma ideia para combater o terrorismo: banir os programas de mensagens pelo celular como o WhatsApp.



É, proibir mesmo. O argumento é simples: esses aplicativos de celular para trocar mensagens de graça codificam os textos, tornando impossível que o serviço de inteligência intercepte mensagens. “Vamos permitir um meio de comunicação que é impossível lermos? Não podemos”, disse Cameron.

Perder algo divertido como o WhatsApp apavorou muita gente. Mas algo incomoda muito mais do que não poder passar o dia trocando fotos e piadas de salão com amigos. É o fato de um governo não aceitar a existência de algo que não pode controlar. Nem mesmo algo tão pueril como um programinha para mandar emoticons à namorada.

Na ficção, a possibilidade de um futuro com pessoas vigiadas por quem deve protegê-las foi analisada à exaustão. Do icônico 1984 – aquele do Big Brother original – até o recente campeão de bilheteria Jogos Vorazes. Neles, estejam em uniformes opacos ou collants de vidrar adolescente, os heróis têm sempre a mesma missão: livrarem-se de governos opressores.

Os futuros distópicos da ficção têm um ingrediente em comum – só um, que nunca varia. É o medo. Seja da guerra nuclear, da natureza enfurecida, de computadores ambiciosos; de macacos, zumbis ou terroristas. O pavor faz brotarem regimes e morrerem liberdades individuais. Esqueça a fantasia e lembre de qualquer ditadura da vida real, sempre prometendo defender o povo de uma ameaça até se tornar a própria.

Não me tomem por paranoico. À diferença dos filmes, não parecemos estar sendo enganados para correr aos braços do Estado em busca de proteção. Duvido inclusive que o WhatsApp seja mesmo proibido – imaginem quantos votos jovens Cameron perderá nas próximas eleições. O problema é o incômodo de perceber que não só devemos temer quem nos ameaça, mas também ficar de olho em quem nos protege.



 Jornalista, editor de Notícias/Digital

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

A DEMOCRACIA REVIGORADA

 

ZERO HORA 15 de janeiro de 2015 | N° 18043


EDITORIAL



O Brasil é desafiado a fortalecer e aperfeiçoar, em três décadas de normalidade institucional, o maior patrimônio da cidadania.O cidadão é o grande protagonista da democracia brasileira, três décadas depois do restabelecimento da normalidade política. Nesta quinta-feira, o país comemora o acontecimento que marca essa conquista a eleição indireta de Tancredo Neves para a Presidência da República, com o encerramento do ciclo de governos militares. A decisão de 15 de janeiro de 1985, mesmo que restrita ao parlamento, criou as condições para que a redemocratização ganhasse forma, especialmente três anos depois, com a promulgação da nova Constituição, e se consolidasse em 1989, com a deliberação popular que, pelo voto direto, elegeu o primeiro presidente pós-1964 sob plenitude institucional.

Até aqui, a normalidade foi testada nas mais variadas circunstâncias, com os desmandos que abreviaram exatamente o primeiro governo civil, com as imperfeições da exagerada centralização de poder no Executivo, com a fragilidade de uma estrutura parlamentar partidariamente fracionada e com sucessivos escândalos de corrupção na atividade pública. O que há de positivo, como contraponto a isso tudo, é que o país tem procurado corrigir seus defeitos, em alguns casos ainda com certa lentidão e displicência, mas em outros com reconhecida determinação.

É preciso admitir que, em grande parte graças à liberdade de expressão, o setor público avançou em transparência, no sentido de facilitar acessos às suas decisões e a dados reveladores do caráter de governos, Legislativos e órgãos do Judiciário. Também qualificamos instituições de controle e vigilância da atividade governamental, com a afirmação do novo perfil do Ministério Público e o aperfeiçoamento dos Tribunais de Contas e das controladorias e corregedorias. Evoluiu, em consequência, a capacidade do cidadão de se transformar em agente ativo dessa fiscalização, ampliando uma intervenção que não mais se resume ao exercício do voto.

O Brasil que estimula e viabiliza, com novas leis, a participação popular no monitoramento da atividade pública também comemora o fechamento do cerco a corruptos e corruptores e a perspectiva, pela ação da Justiça, de moralização da gestão pública. Mas, em sua outra face, a democracia brasileira ainda expõe organismos e autoridades pouco transparentes e um sistema partidário ineficiente, estimulado pelo modelo de governo de coalizão que favorece o clientelismo e o atraso e amplia o já excessivo número de agremiações sem qualquer consistência programática.

O Brasil democrático precisa, igualmente, promover melhorias em áreas que, para muito além da política, são encarregadas de expressar a universalização de direitos constitucionais básicos, como saúde, educação e justiça social, que precisam estar associados a crescimento econômico. Mas o que importa, mesmo com o constrangimento de incompreensíveis retrocessos em determinadas áreas, é a constatação de que a maioria fez a sua escolha. A democracia, apesar dos sobressaltos, é um bem a ser mantido a qualquer custo, como conquista inegociável e irreversível da cidadania.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

TERRORISMO, SEGURANÇA E LIBERDADE



ZERO HORA 13 de janeiro de 2015 | N° 18041



ALEXANDRE WUNDERLICH


Após os ataques nos Estados Unidos, surgiram reações punitivistas que romperam com os limites locais e assumiram posturas internacionais. Diante do balanceamento entre segurança e liberdade e, sobretudo frente ao risco terrorista global, apareceram diversas medidas antiterroristas, todas com um traço comum em sua natureza limitadora dos direitos fundamentais – as mais patentes são relativas à liberdade pessoal. O USA Patriot Act é o exemplo mais claro dessa reação estatal.

O fato é que, na guerra antiterrorista, os Estados, como primeira opção, têm oferecido soluções bélicas que se manifestam em restrições de direitos fundamentais. Na busca de eficiência no combate ao terror, rompem-se os limites ético-jurídicos e admitem-se as violações. É a promoção de uma política legislativa utilitarista e de emergência, que tem recebido apoio no imaginário social, mormente quando a coletividade é motivada pelo medo de novos ataques.

A questão não é simples, porque essa espécie de terror fanático, além de ser violenta, é onipresente. Contudo, as democracias modernas não estão autorizadas a viver em permanente estado de emergência. Em Paris, alguns partidos da ultradireita europeia apregoaram o fechamento das fronteiras, a tortura e o regresso da pena de morte. Limitar direitos e estigmatizar pessoas não é solução e, como é cediço, isto produz danos irreparáveis à democracia. Talvez seja o momento de reconhecer que fracassamos e que somos incapazes de tratar as loucuras do mundo com leis penais, pois a laicidade estatal não pactua com fundamentalismos religiosos. Mais, precisamos ter ciência de que, na busca por remédios, é verdade que neste caso não devemos recorrer ao placebo, mas também não podemos usar de uma dose que mate o paciente.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

A MARCHA PELA LIBERDADE



ZERO HORA 12 de janeiro de 2015 | N° 18040


EDITORIAL



O que a humanidade precisa esperar dessa manifestação na França é que contribua para reforçar a eficiência das ações contra a barbárie, mas também para evitar o uso dos atentados como pretexto para acirrar a intolerância.A histórica marcha contra o terrorismo e em favor da liberdade de expressão, que reuniu ontem cerca de 1,5 milhão de pessoas em Paris, entre as quais dezenas de líderes mundiais, precisa deixar lições que possam ir além do simples rechaço aos assassinatos da última semana. Independentemente do aval ou não à forma de atuação das vítimas do semanário Charlie Hebdo, o que tantos cidadãos e chefes políticos tão diversos como o presidente francês François Hollande, a chanceler alemã Angela Merkel, o chefe do governo israelense Benjamin Netanyahu e o presidente palestino Mahmoud Abbas quiseram mostrar é que a liberdade é um valor acima de todos os outros. Sempre que a sua defesa esmorece, abre-se o caminho para todo tipo de barbárie. A mais recente foi a que atingiu a publicação satírica, seguida pela ocorrida no mercado judaico, ambas na capital francesa.

O que a humanidade precisa esperar dessa manifestação na França é que contribua para reforçar a eficiência das ações contra a barbárie, mas também para evitar o uso dos atentados como pretexto para acirrar a intolerância. As agressões recentes deixaram evidente que os organismos de Estado falharam na defesa dos cidadãos. Essa ineficiência não pode dar margem, agora, para que uma minoria de extremistas, aferrados a interpretações religiosas distorcidas, possa alimentar qualquer tipo de preconceito ou de segregação, como as generalizações ao islamismo, que só contribuem para gerar mais extremismos.

Este é o momento de restabelecer a confiança das populações de países mais visados na capacidade dos governantes de protegê-las de atos típicos de intolerância, mas também de buscar ações que evitem o agravamento das tensões de ambos os lados. Reuniões de cúpula como a marcada para 18 de fevereiro, em Washington, precisam levar em conta que a busca de maior aproximação cultural, num mundo caracterizado cada vez mais pela livre circulação de povos de diferentes países, não pode ser confundida com a debilidade da luta contra o terrorismo.

Nos últimos meses, ficou evidente que, entre os alvos da insanidade, foram incluídos justamente alguns valores democráticos inegociáveis no Ocidente, como a liberdade de expressão. Defendê-la é um dever das autoridades, mas também da sociedade, como demonstrou a marcha em Paris, entre muitos outros atos realizados ontem.

CONTRA O TERROR, A VOZ DA RUA



ZERO HORA 12 de janeiro de 2015 | N° 18040


MILHÕES MARCHAM NA FRANÇA



MANIFESTAÇÃO EM PARIS colocou lado a lado os principais líderes europeus e representantes do Oriente Médio à frente de uma histórica manifestação que ocupou as ruas da capital francesa sob as bandeiras da liberdade de expressão e da tolerânciaDe braços dados e semblante fechado, líderes de diversos países e familiares das vítimas dos recentes ataques terroristas na França lideraram 1,5 milhão de pessoas em uma marcha histórica no frio domingo de Paris. “Eu sou Charlie, judeu, policial!”, “Liberdade, igualdade, desenhem e escrevam!”, “Sou muçulmano, mas não terrorista!” Essas e outras frases expressas pela multidão davam o tom da homenagem aos 17 mortos nos ataques à revista Charlie Hebdo, na quarta-feira passada, a uma policial na quinta-feira e a uma mercearia judaica na sexta-feira.

A caminhada, iniciada na Praça da República pouco antes das 15h30min (12h30min em Brasília), teve um rigoroso esquema de segurança com 5,5 mil policiais e militares. O premiê israelense, Binyiamin Netanyahu, e o presidente palestino, Mahmud Abbas, estavam a poucos metros um do outro.

No ato, foi sentida a ausência do ministro marroquino das Relações Exteriores, Salaheddine Mezouar, que enviou suas condolências à França, mas não compareceu à marcha “em razão da presença de charges blasfematórias” ao profeta do Islã, Maomé no evento, segundo comunicado oficial divulgado pela embaixada marroquina. A ausência de líderes dos Estados Unidos também foi percebida – o embaixador americano na França compareceu à manifestação. O Brasil foi representado pelo embaixador em Paris, José Bustani.

Aos pés da estátua que simboliza a República, homens e mulheres de várias idades, origens e religiões marcaram presença. Momentos de silêncio foram intercalados com cantos – a Marselhesa, hino francês, foi entoada em vários momentos – e palavras de ordem. Diferentemente do clima de terror dos últimos dias na cidade, o ambiente era descontraído. Sorridentes, as pessoas puxavam papo com desconhecidos.

Ao longo da passeata, alguns dirigentes saudaram os moradores de imóveis próximos e foram aplaudidos pela multidão. Meia hora depois do início da marcha, líderes mundiais e personalidades políticas francesas fizeram um minuto de silêncio em homenagem aos 17 mortos. Logo depois, os dirigentes começaram a se retirar da manifestação, enquanto o presidente francês permaneceu no local, entre os manifestantes, e saudou e abraçou familiares das vítimas dos terroristas.

– Paris é, hoje, a capital do mundo. Todo o país se erguerá com o melhor que tem – declarou o presidente francês, François Hollande. – Esta manifestação deve demonstrar o poderio e a dignidade do povo francês, que vai gritar seu amor pela liberdade e a tolerância.

Após a manifestação, Hollande e Netanyahu foram ovacionados ao entrarem na Grande Sinagoga de Paris. Os dois líderes participaram de uma cerimônia em homenagem a “todas as vítimas” dos atentados de Paris, entre elas quatro judeus mortos na sexta-feira por Amedy Coulibaly em um supermercado de produtos judaicos na capital francesa. Netanyahu declarou que aprecia a “posição muito firme” da França e a “determinação” do presidente francês contra o “novo antissemitismo” e o “terrorismo”. O israelense ressaltou ainda que o “inimigo comum é o Islã radical”, e “não o Islã normal”.

AÇÕES CONTRA O TERRORISMO

Atos similares ocorreram em diversas cidades do mundo, especialmente na França – estima-se que 3,7 milhões de pessoas foram às ruas no país ontem. Na pequena cidade francesa de Dammartin- en-Goele, onde os irmãos Said e Cherif Kouachi, supostos autores do ataque contra a Charlie Hebdo, morreram em um enfrentamento com a polícia na sexta-feira, 10 mil pessoas manisfestaram-se contra o terror. O partido de extrema-direita Frente Nacional, presidido por Marine Le Pen, não participou da marcha em Paris e se manifestou em Beaucaire, cidade de 16 mil habitantes no sul do país.

Antes da marcha nas ruas, ministros do Interior de 12 países europeus e o secretário americano da Justiça, Eric Holder, acertaram reforçar a luta contra o terrorismo e marcaram uma reunião para o dia 18 de fevereiro, nos EUA. Entre as medidas previstas estão a intensificação dos controles das fronteiras externas da União Europeia e o intercâmbio de dados de passageiros de vias aéreas.

O ministro do Interior espanhol, Jorge Fernández Díaz, defendeu uma modificação do Tratado de Schengen para permitir controles nas fronteiras dentro do espaço europeu para limitar a mobilidade de combatentes islâmicos de volta à Europa. O Tratado de Schengen instaurou a livre circulação entre os 26 Estados signatários, entre eles 22 da União Europeia. A Bélgica sugeriu uma lista de estrangeiros ligados a grupos islâmicos.

Os ministros consideraram indispensável estabelecer parceria com provedores de internet para identificar e retirar rapidamente “os conteúdos que incitam o ódio e o terror”, segundo a nota oficial distribuída após o encontro.


Em vídeo, sequestrador se declara a serviço do EI


MORTO APÓS INVADIR uma loja judaica e fazer reféns na sexta-feira, Amedi Coulibaly afirma, em gravação divulgada ontem, ter ligações com irmãos Kouachi, que atacaram a revista Charlie HebdoEm vídeo divulgado na internet ontem, um homem que se identifica como Amedi Coulibaly reivindica ter assassinado a policial Clarissa Jean-Philippe na quinta-feira passada, em Montrouge, a sudoeste de Paris. Coulibaly também é responsável pela invasão de um supermercado judaico na capital francesa, onde manteve pessoas sob seu poder. Ele acabou morto na ação policial que invadiu o estabelecimento, onde também tombaram quatro dos reféns. Autoridades confirmaram a autenticidade do vídeo e a polícia trabalha a fim de precisar a origem de sua divulgação.

Na filmagem, de pouco mais de sete minutos, o homem diz ter cometido o crime “em nome do Estado Islâmico” e assegura ter coordenado suas ações com os irmãos Said e Cherif Kouachi, suspeitos do ataque à revista Charlie Hebdo no qual foram mortas 12 pessoas. Segundo ele, as ações foram tomadas em conjunto para ter mais impacto. Coulibaly também se identifica como Abu Basir Abdala al Ifriqi e aparece nas imagens cercado por armas automáticas enquanto fala francês e árabe e tenta justificar os atentados. Ele ameaça os países que fazem parte da coalizão internacional liderada pelos Estados Unidos que ataca a milícia Estado Islâmico (EI) no Iraque e na Síria.

– Vocês atacam o Califado, vocês atacam o Estado Islâmico, nós atacamos vocês – diz no vídeo.

LIGAÇÕES COM REDE AL-QAEDA

Coulibaly já havia afirmado em entrevista a uma rede de TV francesa na sexta-feira, enquanto mantinha mais uma dezena de pessoas com reféns, que tinha atuado em conexão com os irmãos Kouachi. No entanto, o suspeitos do ataque à revista teriam dito pertencer à rede Al-Qaeda na Península Arábica (Aqpa). Ontem, o secretário de Justiça e procurador-geral dos Estados Unidos, Eric Holder, disse que “não há informação confiável” de que a Al-Qaeda esteja envolvida nos ataques de Paris.


Redação de jornal alemão que reproduziu charges é atacada

A sede do jornal alemão Hamburger Morgenpost foi atacada ontem, na cidade de Hamburgo. A publicação reproduziu caricaturas de Maomé feitas pela Charlie Hebdo, um dia após o atentado na revista francesa. Segundo a polícia local, pedras e uma bomba foram atiradas nas janelas da redação do jornal. Não houve feridos, e o fogo foi controlado rapidamente. Duas salas do andar térreo foram danificadas. Duas pessoas foram detidas, segundo a polícia, que está investigando se o ataque tem mesmo relação com as charges.

Na Bélgica, a redação do jornal Le Soir, em Bruxelas, foi evacuada ontem após um telefonema anônimo com uma ameaça de ataque a bomba, anunciou a redação. Toda a Rua Royale, onde fica o jornal, foi isolada pela polícia, acrescentou a agência de notícias Belga.

Em um sinal de apoio a Charlie Hebdo, uma revista católica e um site judeu publicaram charges da publicação ironizando, respectivamente, Jesus, o Papa e o Holocausto e os judeus. “Decidimos colocar on-line algumas caricaturas da Charlie Hebdo que se relacionam com o catolicismo. É um sinal de força ser capaz de rir de algumas características das instituições a que pertencemos. O humor na fé é um bom antídoto para o fanatismo”, explica a revista jesuíta Études, criada em 1956, em um breve editorial ilustrado pela já famosa hashtag “Je suis Charlie” (Eu Sou Charlie) sobre um fundo negro.

O Jewpop, um site cultural judeu muito popular, publicou uma das mais famosas charges da revista, de 1978, que mostra Hitler saltitante com a legenda “Hitler supermaneiro” e um balão em que o nazista diz: “Olá, judeus! E aí?”.

– Nossos pensamentos hoje estão com todas as vítimas do ataque e suas famílias – disse o diretor do site, Alain Granat.

Dois heróis anônimos que salvaram vidas na França

O gerente de uma gráfica que protege sua funcionária dos jihadistas e um muçulmano que escondeu judeus em um supermercado judaico. Foram esses os heróis anônimos que enfrentaram os terroristas responsáveis pelos ataques na região parisiense na semana passada.

Na sexta-feira, às 9h30min, Cherif e Said Kouachi, os dois homens mais procurados da França, invadiram a gráfica de Dammartin-en-Goele. No primeiro andar, o gerente da pequena empresa Michel Catalano, 47 anos, os viu chegar. Imediatamente, saiu para procurar seu desenhista gráfico, Lilian Lepère, 26 anos, “para dizer que se escondesse”. O jovem se refugiou, escondido debaixo da pia do refeitório.

– Eles estavam subindo a escada quando fui encará-los. Tentei falar com eles para ganhar tempo, para que Lilian tivesse tempo de se esconder – contou Catalano.

Os irmãos Kouachi, que não queriam fazer reféns, deixaram Catalano sair. O assistente nunca chegou a ser descoberto pelos fugitivos. Por mensagem de SMS, ele passou informações cruciais à polícia, que matou os irmãos mais tarde.

No supermercado judaico de Paris, um funcionário de origem malinesa e muçulmano praticante, Lassana Bathily, 24 anos, ajudou os clientes assustados a se esconder dentro da câmara frigorífica, também na sexta-feira.

Pouco antes das 13h, Amedi Coulibaly, invadiu o local e abriu fogo contra funcionários e clientes. Um grupo de pessoas, inclusive uma criança pequena, correu pela escadaria no fundo da loja para se esconder na câmara frigorífica. Lassana abriu a porta para eles.

– Ouvi tiros. Depois, vi meu colega e clientes descendo as escadas e disse a eles: venham aqui! Eu os fiz entrar na câmara!

Lassana tomou o cuidado de desligar o sistema de refrigeração e depois propôs fugirem pelo elevador de carga, mas ninguém se animou a correr o risco. Então, fugiu sozinho.

– Fiz todos os mapas” do mercado aos policiais para ajudá-los a preparar a invasão – explicou Lassana.


ENTREVISTA POR LUIZ ANTÔNIO ARAUJO

DOMINIQUE VIDAL - “A resposta principal deve ser social”


Autor de livros sobre as banlieues (subúrbios franceses onde se concentram imigrantes), o Oriente Médio e o Holocausto, o historiador, jornalista e escritor francês Dominique Vidal diz que a França está doente, mas não em razão dos imigrantes ou do islamismo, e sim da exclusão econômica e social e que, com a guerra, “não se ganha nada”.

Por telefone, de Paris, Vidal conversou com Zero Hora na manhã de sábado. A seguir, uma síntese da entrevista:

Como o senhor define o ataque à revista Charlie Hebdo e seus desdobramentos?

É a mais grave ação terrorista perpetrada na França no último meio século. É preciso remontar à Guerra da Argélia para se encontrar uma ação tão grave como essa, em particular contra jornais e jornalistas. Portanto, é um acontecimento importante e grave.

O senhor é Charlie?

Eu diria que sim e não. Sim, por razões evidentes, ou seja, o atentado contra Charlie Hebdo se tornou um símbolo do ataque à liberdade de expressão. É por isso que muitas pessoas dizem hoje “Eu sou Charlie” na França e no mundo. E diria também que não, na medida em que esse horrível atentado não pode barrar o debate com Charlie e com sua redação, notadamente sobre a maneira de tratar a religião em geral e a religião muçulmana em particular. Portanto, eu diria sim e não.

O problema é o Islã?

Certamente não. O que foi perpetrado na quarta-feira, mas também na sexta-feira, com a tomada de reféns na loja kosher em Porte de Vincennes, em Paris, é a ação de uma minoria ínfima. Há dezenas, talvez centenas de jovens que poderiam cair, escorregar para o horror. Eu lhe faço uma pergunta: diante do pesadelo inominável cometido pelo norueguês Breivik (Anders Breivik, terrorista que atacou um acampamento de jovens em 22 de julho de 2011, em Oslo), com 72 mortos no espaço de alguns minutos, você diria que o problema é o cristianismo ou o catolicismo? Certamente não.

Qual é a sua opinião sobre teses como as defendidas por intelectuais franceses como Éric Zemmour, que propõe deportação de imigrantes?

São teses e intelectuais absolutamente ultrajantes. Falar de deportação de muçulmanos da França, que foi a questão tratada numa entrevista a um jornal espanhol, é cometer um crime virtual. Lembro que o III Reich, antes de tentar exterminar os judeus, pretendeu deportá-los. Penso que nomes como Zemmour, o escritor Houellebecq (Michel Houellebecq) e Renaud Camus são os batalhões precursores da Frente Nacional (partido francês de extrema-direita). Isso quer dizer que a islamofobia é um instrumento muito importante da direita, na França e também na Europa, para chegar ao poder. Estamos numa situação extremamente inquietante desse ponto de vista, onde você pode encontrar o discurso e a propaganda da extrema-direita do início do século 20 reproduzidos de forma precisa, com a diferença de que agora os muçulmanos ocupam o lugar dos judeus. Isso é muito preocupante.

A França está doente? De quê?


Penso que é necessário compreender a dialética complicada da situação. Os atiradores não são pessoas comuns – são parte de uma ínfima minoria. Mas, ao mesmo tempo, é preciso considerar que há um terreno para esse terrorismo. E a doença da França está relacionada a esse terreno. É a doença da discriminação, do racismo, da islamofobia, do antissemitismo. Há na França uma parte da população que foi lançada na pobreza e na miséria, que vive em guetos, que são as grandes cidades das banlieues (subúrbios). É evidente que há situações de mal-estar econômico e social, mas também moral, que servem ao terror e ao terrorismo. Desse ponto de vista, não se deve negligenciar os fatos que ocorreram no mundo nos últimos 20 anos. O pesquisador francês Gilbert Achcar (historiador e professor da Universidade de Londres) usa o termo “choque de barbarismos”. Isso quer dizer que há uma parte da população que vê a tortura perpetrada em Abu Ghraib e, depois, em Guantánamo pelos americanos e que vê, de outro lado, o Estado Islâmico (EI). Há uma espécie de pingue-pongue entre esses dois tipos de barbárie. Veja o que acontece na Síria, com mais de 200 mil mortos, a maior parte de muçulmanos, com certeza. Essa matança generalizada certamente marcou esses jovens desesperados. E depois se vê, no verão passado, o ataque contra a Faixa de Gaza, com mais de 2 mil mortos, entre eles mais de 500 crianças. Tudo isso contribui para criar esse terror em meio ao qual o terrorismo pode fazer recrutamentos. Há, portanto, a necessidade de tratar essa doença.

Qual seria a possível solução política?

Penso que há, em parte, a resposta da repressão. É importante que se reforce a polícia para perseguir e prender os terroristas que cometeram esses atentados e outros que possam vir a fazê-lo. Hoje (sábado), há uma declaração da Al-Qaeda no Iêmen que reivindica essas ações, felicita os perpetradores e anuncia outras. Então, há, certamente, uma resposta policial a essa situação. Mas a resposta principal, na minha opinião, na França e na Europa, deve ser social, contra a indiferença em relação a grande parte da população, notadamente os jovens. Há também, em escala mundial, uma reflexão a fazer sobre a incapacidade da guerra de resolver os problemas. Tudo indica que, com a guerra, não se ganha nada. A guerra agrava os problemas. Há necessidade de um outro tipo de abordagem dos problemas, no Oriente Médio, certamente, mas também na África. Eu diria que a resposta não poderá ser somente militar, que é preciso ser uma resposta econômica, social e política.




TERRORISTAS COMEMORAM EXECUÇÕES

TV GLOBO Fantástico Edição do dia 11/01/2015

Imagem mostra terroristas se abraçando para comemorar atentado. Jornalista que trabalha no mesmo prédio do Charlie Hebdo filmou fuga dos terroristas após atentado a jornal.




Vinte mortes, 17 delas de inocentes, em três dias de terror. Uma das cidades mais lindas do mundo, um dos berços da civilização moderna, teve a rotina profundamente abalada essa semana. Brasileiras que moram em Paris e testemunharam esses fatos deram seus depoimentos ao Fantástico. E uma das pessoas que filmaram os assassinos em fuga relembra com imagens exclusivas os momentos de tensão.

Tiros. Correria. Pânico nas ruas de Paris. Quarta-feira passada, 7 de janeiro. Na sede do jornal Charlie Hebdo, um dia de reunião, cartunistas e jornalistas decidem o que fazer para a próxima edição.

São 11h20, hora local, 8h20 no Brasil, dois homens procuram o prédio onde fica o jornal. Encapuzados e armados com fuzis, chegaram a entrar por engano em outro prédio na mesma rua, mas agora sabem onde estão os alvos no número dez da Rua Nicolas Appert. No saguão, encontram dois funcionários da manutenção. Os terroristas atiram e matam um desses empregados, Frèdèric Boisseau, de 42 anos. Onze e meia, eles abordam na escada a cartunista Coco, apelido de Corinne Rey. A cartunista está com a filha, que saiu da creche ainda há pouco. Coco é obrigada a digitar o código eletrônico que destranca a porta do jornal.

Os atiradores entram na sala de reuniões. Coco se esconde com a filha debaixo de uma mesa. Eles reconhecem o editor-chefe do jornal, o cartunista Stéphane Charbonnier. Chamam pelo nome pelo qual ele era conhecido 'Charb' e atiram. Em seguida, vão chamando outros cartunistas e abrindo fogo. Além de Charb, morrem os cartunistas Cabu, Tignous e Honoré. Além de Bernard Maris, um dos sócios do jornal, Elsa Cayat, uma psicanalista e colunista da publicação, a única mulher a ser morta e um dos desenhistas mais respeitados do mundo, George Wolinski.

Três outros participantes da reunião são feridos e dois escapam ilesos, Laurent Leger se joga embaixo da mesa e não é visto pelos atiradores. Sigoléne Vinson fica sob a mira do fuzil. Os terroristas dizem que não vão matá-la porque ela é mulher e mandam que ela se converta ao islamismo. Agora, os terroristas atiram em funcionários que estão na redação. Matam o revisor Mustapha Ourrad e Michel Renaud, que visitava amigos no jornal. Na saída do prédio, os dois ainda matam o policial Franck Brinsolaro, que era segurança do editor-chefe e cartunista Charb. Até agora, são 11 os mortos.

O correspondente André Luiz Azevedo localizou a brasileira Jucilaine Barrault, que é vizinha do jornal. E ela estava em casa quando tudo aconteceu. “Eu ouvi mesmo foi o barulho dentro do imóvel, dentro do imóvel do jornal, foi um barulho onde eu cheguei a pensar que eram bombas”, conta. Jucilaine, casada com um francês, mora em uma esquina, a poucos metros do Charlie Hebdo. “Eu ouvi as primeiras explosões, eu me perguntei: ‘mas o que tá acontecendo?’ E logo em seguida eu ouvi outras explosões, foi aí onde eu corri para a janela. Quando eu corri pra janela, eu vi dois indivíduos que entravam já num carro escuro e fugiam”, diz a brasileira.

A fuga é interrompida. Policiais se aproximam. Uma troca de tiros acontece a cerca de 180 metros da sede do jornal. Um dos policiais é atingido pelos terroristas é Ahmed Merabet, um muçulmano. Ferido, caído no chão, Ahmed se rende, mas leva um tiro na cabeça. É décima segunda vítima fatal.

Entre os flagrantes que assustaram o mundo, estão imagens filmadas com um celular. Quem está filmando, é Martin Boudot, um jornalista francês. Ele trabalha no mesmo prédio do Charlie Hebdo. Na manhã deste domingo (11), o correspondente André Luiz Azevedo conversou com o jornalista. O Fantástico obteve com exclusividade para o Brasil a íntegra da gravação mostrada no vídeo acima. Quando ouviram os primeiros tiros, Martin e os colegas foram para o terraço, tentando se proteger.

Martin diz que, como é jornalista, em uma hora dessas consegue se distanciar da situação e só pensa em registrar o que está acontecendo. Ele conta que viu os terroristas já na rua. Os primeiros policiais chegam de bicicleta. O jornalista orienta os colegas a procurarem um local seguro, do lado esquerdo do terraço. E aí começa o tiroteio. Os terroristas vão em direção ao carro, um deles levanta o braço em comemoração. Martin diz ainda que conseguiu entender o que o atirador disse nessa hora: "Nós vingamos o profeta, nós vingamos o profeta."

Uma das pessoas que se abriga no terraço se arrisca indo até o parapeito para tentar ver o que estava acontecendo. Depois disso, o vídeo mostra uma imagem que até este domingo era inédita: no fundo da imagem, os terroristas se abraçam para comemorar a chacina. No momento em que os atiradores voltavam para o carro, o jornalista teve medo. "Tive medo que eles nos vissem", diz Martin. "Medo de que eles voltassem pro prédio". O que felizmente não aconteceu.

O jornalista francês Wandrille Lanos, que fala português, também trabalha no mesmo edifício do Charlie Hebdo. “Quando cheguei, vi um corpo abaixo no chão. Com um pouco de sangue. Não sabia o que fazer, porque era a confusão máxima. Seguimos, entramos juntos na sala maior, de reunião. A gente viu no chão que havia muitas, muitas pessoas, sabe? Muitos corpos”, conta o jornalista.

A notícia do ataque se espalha pela cidade e pelo mundo. Começam as buscas. Paris é colocada no alerta máximo. À noite, os suspeitos são identificados pela polícia: os irmãos Chérif e Said Kouachi, descendentes de argelinos. Próximo ao local do ataque, começam as vigílias e homenagens aos mortos.

O dia seguinte, quinta-feira (8), amanhece com um tiroteio no subúrbio de Paris. A policial Clarissa Jean-Philippe, de 25 anos, é morta. O bandido foge. As autoridades logo descobrem que esse ataque foi cometido por Amedy Coulibaly, de 32 anos. E que Amedy é parte da mesma célula terrorista dos irmãos Kouachi.

Oitenta e oito mil oficiais de segurança seguem a busca nas ruas de Paris. À noite, as luzes da Torre Eiffel se apagam em luto. Sexta-feira (9), após dois dias em fuga, os irmãos Koauchi são encurralados em uma gráfica, na cidade Dammartin-en-Goële, a 40 quilômetros ao nordeste de Paris. Por telefone, o mais novo, Chérif Kouachi, fala com um jornalista da TV local BFMTV. “Nós, eu afirmo, nós somos os defensores do profeta. E eu, Cherif Kouachi, fui enviado pela Al- Qaeda do Iêmen”, diz.

No mesmo dia, Amedy Coulibaly, o homem que matou uma policial, invade um supermercado de produtos judaicos. Com um rifle, ele faz reféns. Amedy ameaça abrir fogo se a polícia tentar capturar os irmãos Kouachi. E também conversa, por telefone, com o mesmo jornalista que falou com Chérif.

Jornalista: Você tem alguma ligação com os dois irmãos que fizeram a operação no Charlie Hebdo?
Amedy Coulibaly: Sim, nós fizemos as operações sincronizadas.

O enviado especial André Luiz Azevedo conversou com uma brasileira que mora bem perto do supermercado.

Fantástico: O que chamou primeiro a atenção, que você correu pra varanda?

Elizabeth Gabelo: Foi a quantidade de policiais que iam chegando, os carros, e eles descendo dos carros e o helicóptero. O policial tinha um megafone, dizendo para as pessoas saírem da rua, não ficarem na rua. As lojas foram todas fechadas imediatamente. O que me chamou atenção foi a rapidez, a eficiência da polícia e a obediência do povo francês, porque eu como brasileira já ia querer perguntar o que que está acontecendo. A pedido da polícia, Elizabeth fechou a janela voltou para a sala. O resto dessa história, ela viu pela TV.

Agora, no horário local, são quase 17h de sexta feira. Do outro lado da cidade, os irmãos Kouachi saem da gráfica atirando. São mortos pela polícia. Quase ao mesmo tempo, policiais entram no supermercado, matam Coulibaly, parceiro dos irmãos, e libertam 15 pessoas. Mas, na ação, quatro reféns acabam morrendo. Segundo as autoridades francesas, assassinados pelo sequestrador antes da invasão policial. É o fim de três dias de horror em Paris, 17 inocentes mortos no total.

“A gente se sente inseguro. Nessa semana a gente tá muito inseguro aqui, mas eu penso que tudo isso vai se acalmar o mais rápido possível, e que a gente possa retomar uma vida normal”, diz Jucilaine.

domingo, 11 de janeiro de 2015

REAÇÃO FRANCESA CONTRA O TERRORISMO



ZERO HORA 11 de janeiro de 2015 | N° 18039


ENTREVISTA

“A reação está à altura do momento histórico”



EDUARDO CYPEL, Deputado socialista francês

Natural de Porto Alegre, o deputado francês Eduardo Cypel falou por telefone a ZH sobre a tensão vivida na França. Para ele, o país deve se unir para enfrentar valores contrários à tradição de igualdade, fraternidade e liberdade. Confira trechos da entrevista.

Qual o significado do atentado no berço do Iluminismo?

A França está vivendo um momento histórico. Estamos enfrentando um terrorismo que passa por cidadãos franceses, que se sentem implicados em um terrorismo ideológico. O objetivo é aterrorizar a França e abalar os valores de liberdade, igualdade e fraternidade. Querem tocar o coração da república. Por isso, atingiram um órgão da imprensa tão importante. Os terroristas quiseram tocar na cultura, republicana, que vem do Iluminismo, da Revolução Francesa.

A França também é o país das caminhadas contra o casamento gay e de outros atos conservadores. Com o atentado, os terroristas não querem aumentar a intolerância e a tensão?

Há mais de dois séculos, sempre houve tensões, com forças obscurantistas, reacionárias, que dividem. A França passou por momentos trágicos, mas soube superá-los. E sempre esteve à altura desses valores fundamentais de liberdade, democracia, igualdade e solidariedade. A reação do povo hoje está à altura do momento histórico. Estamos erguendo a cabeça para dizer não, para enfrentar esse momento difícil, preservar o que é essencial, que são esses valores. A França ainda é uma república onde todos podem viver juntos.

Não temem o crescimento da extrema direita xenófoba?

A França tem problemas que precisa enfrentar. Tem crises econômica, social e de identidade, de um país que está se interrogando para saber como se colocar neste mundo novo, que provoca medo e cria uma angústia legítima. Temos ameaças novas. São ameaças terroristas claras, uma nova forma de terrorismo, ligada a pessoas que estão aqui na França, que podem ser de uma forma ou outra tocadas pelo islã ou pela religião muçulmana. Entre essas pessoas, não há só quem nasceu em famílias muçulmanas. Há convertidos. Hoje, há mais de mil franceses implicados no que acontece com o jihadismo na Síria, no Iraque, no Estado Islâmico (EI). Vários estão na linha de frente do EI. Temos de enfrentar isso, mas com os valores da democracia, sem cair nos erros dos Estados Unidos no ataque da Al Qaeda e que levou (o presidente George) Bush a intervir no Iraque de forma inadequada e ilegal.

A intolerância da extrema direita pode se estender a outras minorias?

Há risco de essas tensões aumentarem e haver conflitos interétnicos, religiosos, que poderiam levar a uma guerra civil. Mas é isso que a França está mostrando que não vai deixar que ocorra. A reação do povo é de saber se unir em torno dos valores essenciais. Precisamos levar tudo muito a sério para não deixar nada ir por outro caminho que não seja o republicano.

Como fazer isso?

Toda a sociedade tem responsabilidade. E a França está mostrando que sabe o que é fundamental. No domingo, teremos essa grande demonstração de força. Essa mobilização será a maior demonstração para nos unir. Ninguém vai nos abalar. Nenhum terrorista vai conseguir tocar no que é a França. A força da França e da liberdade é um poder universal.

O que explica franceses se voltando ao extremismo islâmico?

Somos 67 milhões, e há mil franceses implicados. A direita fascista já teve 10% dos votos nas eleições. Essas forças existem no país, mas são minoritárias. Temos de enfrentar esse momento, analisar esses processos de fanatização e prevenir melhor. É uma radicalização que devemos saber lidar nos antecipando, pela educação.

Em que momento será importante a repressão?

Quando a lei determinar, pela democracia. Hoje, a lei prevê mais alternativas (a França aprovou, em 2014, lei antiterrorismo que dá maiores poderes para controlar o deslocamento de potenciais jihadistas da França a países em conflito).

QUATRO REFÉNS FORAM MORTOS POR TERRORISTA

ZERO HORA 11/01/2015 | 03h37

Saiba quem são os quatro reféns mortos por terrorista em centro comercial de Paris. Um deles teria tentado atirar contra Amedy Coulibaly, mas a arma estaria travada


Em sentido horário, Braham, Saada, Cohen e Hattab Foto: Montagem sobre fotos / AFP

Foram divulgadas imagens dos quatro reféns mortos no ataque do terrorista Amedy Coulibaly, 32 anos, a um centro comercial judaico em Porte de Vincennes, no leste de Paris, na sexta-feira.



Após invadirem o local, os policiais mataram Coulibaly no momento em que tentava fugir. Segundo a imprensa francesa, pelo menos três das vítimas já estariam mortas antes da invasão das forças de segurança. Veja quem são:



Yohan Cohen



Morador de Sarcelles, no norte de Paris, Yohan Cohen tinha 22 anos e trabalhava no centro comercial invadido pelo terrorista. Segundo o jornal Daily Mail, ele estava juntando dinheiro para casar com a namorada. Em seu perfil no Facebook, a jovem homenageou Cohen e escreveu, em tom de desabafo:

— Minha vida está arruinada sem você. Não conseguirei coisa alguma. Nós tínhamos tantos planos. Por que você?

Yoav Hattab



Filho do rabino-chefe de Túnis, capital da Tunísia, Yoav Hattab tinha 21 anos e morava sozinho em Paris, onde estudava. Conforme a CNN, vinha de uma família de sete filhos e, recentemente, havia visitado os parentes em sua cidade natal. O próprio irmão dele teria divulgado sua identidade em uma rádio francesa.

— Que Deus vingue seu sangue e de todos os inocentes assassinados a sangue frio por bárbaros, apenas porque você era judeu. Descanse em paz, pequeno anjo — escreveu a amiga de Hattab, Marie Assous, no Facebook.

Philippe Braham



O professor Philippe Braham tinha cerca de 40 anos e morava na cidade de L’Hay-les-Roses, ao sul de Paris, com a mulher e três filhos, de acordo com o Daily Mail. Um dos sobreviventes do ataque teria contado à polícia que Braham conseguiu tomar uma arma do terrorista e apontá-la contra o sequestrador. Porém, estaria travada. Coulibaly teria reagido e atirado contra o professor.

— Ele não costumava falar muito, mas era um bom homem — disse um vizinho ao Daily Mail.

François-Michel Saada



O executivo aposentado François-Michel Saada tinha 63 anos, há 30 casado com a mulher, Laurence. Deixa dois filhos que moram em Israel, segundo a CNN. Nasceu na Tunísia. O Conselho Representativo das Instituições Judaicas francesas confirmou sua identidade.



Reféns passam cinco horas em câmara frigorífica de mercado para se esconder de terrorista
Quatro reféns foram mortos por terrorista no estabelecimento



Reféns foram libertados após ação da polícia Foto: THOMAS SAMSON / AFP

Escondidos debaixo de uma pia, ou em uma câmara frigorífica, vários envolvidos nas duas tomadas de reféns na região parisiense conseguiram escapar — entre eles, estava um homem com o filho de apenas três anos.

Na gráfica, no nordeste de Paris, onde os irmãos Kouachi foram cercados, o funcionário Lilian, de 26 anos, escondeu-se "debaixo de uma pia na sala de restauração" do segundo andar, contou o procurador de Paris, François Molins, acrescentando que o jovem está "aterrorizado".


Enviando mensagens pelo celular, ele conseguiu dar "elementos táticos, como sua posição dentro do prédio, para a célula de negociação" do GIGN (Grupo de Intervenção da Gendarmeria Nacional), a unidade de elite encarregada dessa operação, explicou uma fonte ligada à investigação.


A cerca de 40 quilômetros dali, pouco antes das 13h (horário local), Ilan fazia as compras, em seu bairro, no supermercado Hyper Cacher, de Porte de Vincennes, preparando-se para o Shabbat que começaria em algumas horas. Ele estava acompanhado do filho de três anos e meio, enquanto a mulher ficou em casa.


Naquele momento, Amedy Coulibaly invadia o estabelecimento e abria fogo com um fuzil Kalachnikov. O pai e seu filho se esconderam em uma câmara frigorífica. Pelo menos outras três pessoas estavam com eles. O grupo ficou quase cinco horas lá dentro.

A mãe de Ilan disse que seu filho e o neto estavam escondidos e preferiu não tentar entrar em contato com eles, nem mesmo por mensagens de texto. O número do celular foi passado, porém, para as forças da ordem. Graças a esse número, os policiais conseguiram localizar o celular de Ilan e descobrir onde o grupo estava escondido.




Confira imagens do atentado: