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segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

A SELVAGERIA ORGANIZADA



ZERO HORA 07 de dezembro de 2014 | N° 18006

O CALIFADO DO TERROR


Tortura, assassinatos, estupro, escravização sexual e recrutamento militar de crianças estão entre os crimes do Estado Islâmico, segundo a ONUQuando um franco-atirador do Estado Islâmico (EI) acertou dois tiros no braço esquerdo de Khalil Nimir, em Kobani, norte da Síria, o trabalhador sírio de 67 anos decidiu que havia chegado o momento de deixar afazeres e bens para trás e se juntar ao resto da família na Turquia. Espremido numa barraca na cidade turca de Suruç, em companhia de 14 parentes, incluindo cinco mulheres e oito crianças, ele recorda sem emoção a impressão que teve ao se somar à larga estatística de vítimas do exército do estandarte negro:

– Os homens do EI bombardeiam de forma indiscriminada. Eles não se importam com civis.

Não é apenas a curdos como Nimir que o grupo reserva um tratamento brutal. Para o EI, aterrorizar a população comum, independentemente de sexo, idade, nacionalidade, credo ou etnia, é uma arma barata e de fácil manejo. Num relatório divulgado em novembro, a Organização das Nações Unidas lista crimes perpetrados por seus combatentes desde abril do ano passado na Síria: assassinatos, cativeiro, estupro, escravização sexual e violência, migração forçada, desaparecimentos e tortura. No Iraque, segundo a ONU, essa galeria é acrescida de mais dois suplícios: recrutamento militar de crianças e destruição de patrimônio religioso e cultural. “De acordo com a evidência coletada, há razoável margem para acreditar que o EI perpetrou esses ataques conforme uma política organizacional”, conclui o estudo sobre a Síria.

Por qualquer manual militar, os métodos do EI podem parecer contraproducentes. Afinal, se a força bruta ainda é insubstituível no campo de batalha, pode se tornar uma faca de dois gumes quando as armas se calam. No caso do EI, há pelo menos três fatores poderosos a estimular o recurso ao governo na ponta do fuzil.

Em primeiro lugar, o grupo penetrou tardiamente na guerra síria, quando o exército regular fiel ao regime de Bashar al-Assad já havia se desintegrado ou sido varrido de bolsões no oeste e no norte do país e as facções de oposição se dedicavam a massacrar umas às outras. Nesse contexto, apesar da crueldade, o EI despontou como força estabilizadora: tinha disciplina, estrutura de comando e código coerente de conduta.

Para o ex-capitão de artilharia do exército sírio Munthir Diwany, 36 anos, de Deir az-Zaur, o avanço do EI foi facilitado pelo equilíbrio instável entre as forças do regime e da oposição depois de mais de dois anos de guerra. Diante de uma taça de chá num café de Sanliurfa, na Turquia, onde vive exilado com a mulher e três filhos, Diwany afirma que a atitude das potências ocidentais cumpriu um papel decisivo nesse desenlace:

– No início da guerra, o Exército Livre da Síria (ELS) avançou e obteve algum apoio estrangeiro. Depois, quando o regime contra-atacou, esse apoio minguou. As potências não desejavam que essa situação persistisse. Foi esse impasse que permitiu o crescimento dos grupos jihadistas, dos quais a Frente Al-Nusra e o Estado Islâmico são as principais faces.

Outro incentivo à violência por parte do Estado Islâmico foi o de que muitos de seus efetivos são estrangeiros, que costumeiramente sequer falam árabe ou curdo e são pouco permeáveis aos ânimos locais. Finalmente, o código legal muçulmano, mesmo na versão mais radical que inspira os adeptos do califa, está longe de ser a lei da selva. Para uma parcela significativa dos que vivem sob seu jugo, o regime do EI pode parecer inovador ou retrógrado, justo ou arbitrário, mas não permite que alguém sofra discriminação por ser sunita. Sob o regime de Al-Assad, por outro lado, essa era a regra.

A relativa estabilidade da Península Arábica ao longo dos anos 1990 fez com que organizações terroristas precursoras do EI, como a Al-Qaeda, jamais tenham se interessado pelo controle de território. Osama bin Laden e seu grupo debutaram na guerra a milhares de quilômetros de distância das terras árabes, nos picos montanhosos entre Afeganistão e Paquistão. Embora a Al-Qaeda pretendesse, desde o início, impedir que americanos e europeus (“cruzados”) estacionassem tropas no mesmo solo das cidades santas de Meca e Medina, seus fundadores nunca arregimentaram mais do que algumas centenas de simpatizantes na Arábia Saudita, em parte por força da repressão. O EI foi o primeiro grupo jihadista a assumir a tarefa de governar milhões de árabes (isso inclui coletar impostos e administrar negócios). Mais do que isso: para explicar a decisão de proclamar o califado, apoiou-se numa interpretação religiosa segundo a qual o estabelecimento dessa instituição é uma obrigação coletiva dos muçulmanos.

Para Diwany, que desertou do exército sírio em 2012 e enfrentou, como parte das forças rebeldes, o cerco do EI a Deir az-Zaur, as forças do califado são, do ponto de vista militar, apenas medianas. Suas qualidades residiriam em quatro aspectos: equipamento, disciplina, inteligência e propaganda.

– Nossas batalhas (do ELS) contra o EI não eram equilibradas. As vitórias deles não se devem ao fato de serem melhores combatentes, e sim de terem mais mídia e mais inteligência. Seu armamento também era superior.

Sobre o perfil dos combatentes do EI, o ex-militar diz:

– Eles não são simples soldados sírios. São homens que têm experiência de combate em distintos lugares do mundo. Também usam a religião. Seu lema é: “Ouvir ordens e cumpri-las”. Não negociam. Quando um soldado ouve uma ordem do comandante, apenas cumpre. São muito disciplinados e organizados.


VÍTIMA DO CALIFADO. O sírio Khalil Nimir, 67 anos, levou dois tiros no braço esquerdo e hoje é um dos refugiados na cidade turca de Suruç, com 14 parentesDESERTORMunthir Diwany enfrentou o EI como parte das forças rebeldes sírias

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