Revelamos aqui as causas e efeitos da insegurança pública e jurídica no Brasil, propondo uma ampla mobilização na defesa da liberdade, democracia, federalismo, moralidade, probidade, civismo, cidadania e supremacia do interesse público, exigindo uma Constituição enxuta; Leis rigorosas; Segurança jurídica e judiciária; Justiça coativa; Reforma política, Zelo do erário; Execução penal digna; Poderes harmônicos e comprometidos; e Sistema de Justiça Criminal eficiente na preservação da Ordem Pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

domingo, 30 de março de 2014

MEIO SÉCULO DEPOIS, RELEMBRAR É PRECISO


ZERO HORA 30 de março de 2014 | N° 17748


PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA


Não é incomum se ouvir de quem não sofreu os horrores da ditadura que naquele tempo era melhor. Que não havia corrupção nem insegurança ou que o país crescia como um Tigre Asiático. Esquecem os saudosistas que também não havia imprensa livre para denunciar as atrocidades do regime e que um jovem inocente podia ser torturado e morto se fosse confundido com um terrorista. Nos 50 anos do golpe, é preciso mostrar aos jovens o que foram os 21 anos de regime militar e reafirmar uma obviedade com frequência ignorada: não existe ditadura boa. Nem de direita, nem de esquerda.

Há uma novidade neste aniversário em comparação com os 10, 20, 30 ou 40 anos do golpe: graças ao trabalho da Comissão da Verdade, aos depoimentos das vítimas e às confissões dos torturadores, sabe-se mais sobre o que se passou nos porões do regime. Revelações sobre o que aconteceu com desaparecidos notáveis, como o ex-deputado Rubens Paiva, ajudam os jovens nascidos depois da redemocratização a entender a lógica dos militares nos Anos de Chumbo: na guerra contra o fantasma do comunismo, valia torturar, matar e sumir com o corpo. Na ótica dos líderes de esquerda, na luta contra os militares valia matar, sequestrar e assaltar bancos para financiar a guerrilha.

Diferentemente do que aconteceu na Argentina, no Brasil as descobertas da Comissão da Verdade servirão apenas para que se conheça a História. Nenhum torturador será punido, ninguém será condenado pela morte ou pelo desaparecimento de presos. Em agosto, a Lei da Anistia completa 35 anos.

Apesar das vozes isoladas que pregam a volta da ditadura, não há clima para retrocesso. O fracasso das tentativas de reeditar as “marchas da família”, que antecederam o golpe de 1964, atesta que a democracia está sólida. Nos quartéis, os militares mostram-se dispostos a respeitar a Constituição. Para completar, o mundo mudou com o fim da Guerra Fria. O comunismo, que em 1964 era temido pelos civis avalistas do golpe, desandou com o esfacelamento da União Soviética e hoje é ridicularizado na figura do ditador da Coreia do Norte ou cultuado por uma parcela que ainda considera Cuba seu ideal de sociedade. Há problemas, mas o país respira liberdade, as eleições entraram na rotina e as instituições estão sólidas.


Números da repressão

- 366 mortos ou desaparecidos
- 4.862 mandatos eletivos cassados
- 500 mil cidadãos investigados
- 200 mil detidos por subversão
- 10 mil torturados nos DOI-Codi
- 10 mil brasileiros exilados
- 3 vezes o Congresso foi fechado
- 1.202 sindicatos sob intervenção
- 128 brasileiros banidos

Fonte: Movimento de Justiça e Direitos Humanos

Aliás

Quase 30 anos depois da volta da democracia, as escolas de Ensino Fundamental e Médio tratam o golpe de 1964 e seus efeitos de forma superficial.



MARCADO PARA SEMPRE



A equipe do cineasta Paulo Nascimento, responsável pelo filme Em Teu Nome, que conta a história do ex-integrante da luta armada na ditadura João Carlos Bona Garcia (foto), chegou à Base Aérea de Canoas otimista, durante a pré-produção do longa. O objetivo parecia simples: fazer imagens do local, onde, em janeiro de 1971, o ex-guerrilheiro, preso e torturado pelos militares, foi trocado pelo embaixador da Suíça Giovanni Enrico Bucher, sequestrado pela Vanguarda Popular Revolucionária. Quando os oficiais que atenderam o grupo souberam que a gravação era para o filme sobre Bona, negaram:

– Aquele terrorista? Ele tinha de estar morto – disse um deles.

Para Bona, hoje com 67 anos, o episódio mostra um dos piores legados deixados pela ditadura à sociedade brasileira: a resistência dos militares em assumirem os erros cometidos no período.

– Os militares que atenderam o Paulo Nascimento eram jovens, não eram do Exército durante o regime. Como que eles poderiam dizer isso de mim, sem nem me conhecer?! Por que eles (militares) não assumem o que fizeram? Em outros países, como no Chile e na Argentina, as forças armadas reconheceram. Custa dizer? Não! – indigna-se.

Bona diz que as escolas militares suprimem dos ensinamentos as partes negativas do regime, o que faz com que os jovens estudantes e futuros soldados e oficiais não renovem o discurso encampado pela ditadura.

Após sofrer nas mãos dos torturadores e ser banido do país, Bona retornou ao Brasil em 1979 e mergulhou na política – concorreu a prefeito em Passo Fundo pelo PMDB e foi chefe da Casa Civil durante o governo Antonio Britto. Hoje, vive em um confortável apartamento no bairro Rio Branco, na Capital. Bem diferente dos locais onde se abrigou durante o exílio.

– Tive de começar do zero várias vezes, com um colchão e um fogareiro – lembra.

O ex-guerrilheiro também passou por uma experiência peculiar para alguém que lutou contra a ditadura ao ser nomeado, em 1998, juiz do Tribunal de Justiça Militar. A posse foi contestada pelos militares na Justiça, mas acabou mantida. Anos depois, Bona chegou à presidência da Corte.

– Foi uma experiência espetacular. Uma vez, em um evento, os militares viraram as costas para mim. Tentei sempre fazer o trabalho mais isento possível – conta.

O cinquentenário do golpe é a oportunidade, na opinião de Bona, de trazer à tona a memória da ditadura e valorizar a liberdade:

– Nosso país não cultiva a memória. Temos muito o que melhorar, mas as pessoas têm de entender que agora elas têm liberdade para pedir. Temos de valorizar isso.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Faltou enumerar os policiais e militares mortos e torturados durante a repressão.

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