Revelamos aqui as causas e efeitos da insegurança pública e jurídica no Brasil, propondo uma ampla mobilização na defesa da liberdade, democracia, federalismo, moralidade, probidade, civismo, cidadania e supremacia do interesse público, exigindo uma Constituição enxuta; Leis rigorosas; Segurança jurídica e judiciária; Justiça coativa; Reforma política, Zelo do erário; Execução penal digna; Poderes harmônicos e comprometidos; e Sistema de Justiça Criminal eficiente na preservação da Ordem Pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

LIBERDADE E AUTORIDADES

DANIEL SARMENTO, promotor público federal e professor de Direito Constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. O GLOBO, 25/08/2011 às 18h40m


A imprensa noticiou a recente condenação criminal de jornalistas equatorianos por crime contra a honra supostamente cometido contra o presidente Rafael Corrêa. Apontou-se, com razão, que condenações dessa espécie ameaçam a liberdade de expressão e a própria democracia, que pressupõe, para o seu funcionamento, a existência de um ambiente de liberdade, no qual os cidadãos e a imprensa possam denunciar possíveis abusos dos governantes de plantão, criticando-os com veemência, sem o receio de se sujeitarem a ações penais ou ao pagamento de vultosas indenizações.

Em matéria de liberdade de expressão, o cenário nacional é muito melhor do que aquele que se desenha no Equador ou em outros Estados sul-americanos que rezam pela cartilha "bolivariana". Estas diferenças podem ser atribuídas a vários fatores, como a intensa proteção dada pela nossa Constituição às liberdades públicas, a maior vitalidade da nossa sociedade civil e a independência do Poder Judiciário brasileiro. Apesar disso, graves riscos e ameaças à liberdade de expressão ainda existem no nosso país. Um deles vem do tratamento dado aos crimes contra a honra no Código Penal brasileiro, que, nesta parte, foi redigido em 1941, no auge da ditadura Vargas.

O Código Penal prevê que a pena atribuída aos crimes contra a honra cometidos contra o presidente da República e chefe de governo estrangeiro, ou contra funcionário público em razão de suas funções, é um terço maior do que aquela estabelecida para o mesmo delito, quando praticado contra qualquer mortal. Além disso, no crime de calúnia - imputação falsa de fato definido como crime -, praticado contra o presidente da República ou chefe de governo estrangeiro, o legislador sequer admite que o acusado se defenda provando a veracidade do que dissera. Estas normas penais estão em absoluto descompasso com a Constituição de 88, e têm como efeito a inibição das críticas públicas voltadas contra determinadas autoridades.

No regime republicano, não há autoridade que esteja acima do bem e do mal. Pelo contrário, quanto maior o poder exercido por um agente público, mais protegida deve ser a liberdade do cidadão e da imprensa para criticá-lo. Afinal de contas, ele não cuida do que é seu, mas da "coisa pública". Discutir as ações dos agentes estatais é interesse de todo o público, que deve ter o mais amplo acesso a informações e a opiniões variadas sobre elas - inclusive as mais cáusticas e contundentes--, para que cada um possa formar livremente a própria opinião. Diante disso, um parâmetro essencial para equacionar os conflitos entre a liberdade de expressão e o direito à honra, adotado em todos os países democráticos, é o da natureza da pessoa atingida. Entende-se que, em se tratando de pessoas públicas, a proteção à honra deve ser menor, cedendo espaço ao exercício mais desinibido das liberdades de expressão e imprensa.

A legislação penal brasileira, neste ponto, está na contramão da Constituição e da democracia, pois adotou parâmetro diametralmente oposto. Passou da hora de corrigir esta excrescência. O Senado Federal está formando comissão para estudar a revisão do Código Penal. Este é um tema que a comissão deveria enfrentar. E o STF tem se revelado um ativo defensor da liberdade de expressão, proferindo, nos últimos anos, decisões históricas nesta área, como a que invalidou a lei de Imprensa da ditadura militar, a que afastou restrições ao humor nas eleições e a que liberou a chamada "Marcha da Maconha". Seria muito bom que a nossa Suprema Corte fosse provocada a se manifestar sobre este entulho autoritário contido no Código Penal.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O autor deste artigo esquece que temos uma Constituição corporativa e benevolente, que a nossa sociedade tem se mostrado impotente e tolerante e que o Poder Judiciário brasileiro não é totalmente independente, já que as cortes supremas se submetem às influências políticas-partidárias. O Código Penal é arcaico, os princípios que regem um regime republicano são violados impunemente e a liberdade de expressão tem sido amordaçada por decisões judiciais a serviço do poder político e financeiro - veja o exemplo do Jornal O Estado de São Paulo e dos vários jornalistas que foram processados e condenados, contrariando a afirmação do autor de que "o STF tem se revelado um ativo defensor da liberdade de expressão".

Nenhum comentário: